O Rio de Janeiro é o espelho do Brasil. O que ocorre no Rio de Janeiro fatalmente se transmitirá em cadeia para os outros Estados da Federação. As questões de justiça criminal e ordem pública não fogem desta regra. Portanto, é estratégico manter a atenção, estudar o cenário, analisar as experiências e observar as políticas lá realizadas, ajudando no alcance dos objetivos. A solução desta guerra envolve leis duras e um Sistema de Justiça Criminal integrado, ágil, coativo e comprometido em garantir o direito da população à segurança pública.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

A GUERRA DE NITERÓI

Acuados pelas UPPs no Rio, bandidos atravessam a ponte, aterrorizam a cidade vizinha e o governo arma ofensiva para enfrentá-los. Wilson Aquino - REVISTA ISTO É N° Edição: 2215, 22.Abr.12 - 11:51




Ligada à cidade do Rio de Janeiro por uma ponte de 13,29 quilômetros sobre o mar, Niterói sempre conseguiu combinar as vantagens das cidades pequenas com as facilidades de estar bem próxima a uma metrópole. Dona da maior renda per capita do País, R$ 2.031, com 30% dos moradores na classe A, também detém o terceiro melhor índice de qualidade de vida do Brasil, de acordo com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).

O cotidiano de seus 500 mil habitantes, porém, não é mais tranquilo como no passado. Somente na primeira quinzena do mês, cinco pessoas foram baleadas. Um médico, um universitário, uma dona de casa, um policial militar fora de serviço e um fiseoterapeuta. Os quatro primeiros morreram, o último corre o risco de ficar cego. A violência que se abate sobre os niteroienses tem a ver com a queda da criminalidade na cidade do Rio.

A instalação das Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs) em favelas cariocas expulsou os traficantes, que se refugiaram no município vizinho e, agora, atacam sua população. O governo estadual atentou para a situação e promete uma ofensiva à altura.



“Antes, a gente fechava o bar quando o último freguês pedia a conta. Atualmente, estamos pedindo para os clientes irem embora porque o medo nos obriga a fechar mais cedo”, lamenta Carlos Manhães, 50 anos, dono de um bar no Ingá, área nobre de Niterói, que, em 23 anos de funcionamento, nunca tinha sido assaltado. Em fevereiro, o estabelecimento sofreu dois assaltos por homens armados. De seis meses para cá, verificou-se o aumento na incidência de assaltos ao comércio, às residências e aos pedestres na cidade.

“A gente percebe que os bandidos são ‘estrangeiros’ por causa da forma gratuita com que as vítimas são machucadas, mesmo sem esboçar reação”, diz o teólogo Antonio Carlos Costa, coordenador da Organização Não Governamental Rio de Paz e morador de Niterói.

A polícia detectou que traficantes cariocas do Morro da Mangueira e da favela da Maré se instalaram em favelas do município. Na sexta-feira 13, PMs evitaram a invasão do Morro do Palácio, no Ingá, por parte de bandidos da comunidade Mandela, do Rio.



Para a antropóloga Ana Paula de Miranda, coordenadora do grupo de estudos da violência da Universidade Federal Fluminense (UFF), no entanto, a migração é apenas parte de um problema maior.

“Talvez explique o acirramento dos atos violentos, que são antigos. Não vejo policiamento em Niterói há muito tempo”, afirma. A antropóloga ressalta que a onda atual teve início justamente após o assassinato da juíza Patrícia Acioli, em agosto do ano passado.

“Esse crime foi um marco e revelou toda a fragilidade da cidade”, afirma.

Alunos, professores e funcionários da UFF estão entre os primeiros a perceber essa vulnerabilidade. O grande número de assaltos que eles sofreram na rua General Andrade Neves, via de acesso à universidade, acabou por rebatizar o local como “Rua do Perdeu”.

É que, na gíria de marginais das favelas do Rio, essa é a senha do assalto.

“Eles apontam a arma para a vítima e dizem ‘perdeu, perdeu’”, explica uma aluna da universidade que prefere não ter o nome divulgado.

Para evitar que alunos e funcionários transitem pela perigosa rua, o reitor Roberto Salles comprou três ônibus para transportar o pessoal entre a instituição e um terminal de barcas.



Acuada, a população tem reagido por meio de manifestações públicas. Este ano já foram quatro, a última no sábado 21, na Praia de Icaraí, organizada por universitários que fundaram o movimento Niterói Quer Paz.

“Não somos contra a pacificação do Rio, mas queremos um plano de segurança para Niterói também”, explicou o estudante Raphael Costa, 17 anos.

“A população cresceu e o número de policiais diminuiu”, diz Costa, referindo-se ao fato de que na década de 80 havia 1,2 mil PMs na cidade e hoje são cerca de 700.

O secretário de Segurança Pública do Estado, José Mariano Beltrame, reconheceu que o município pode estar sendo invadido por criminosos cariocas e anunciou medidas de emergência para conter a violência.



A principal delas é a instalação de duas Companhias de Polícia, cada uma com 100 homens, em duas favelas de Niterói: Cavalão, na zona sul, e Estado, no centro. O policiamento motorizado também foi reforçado. Durante a inauguração de duas UPPs no Complexo do Alemão, na quarta-feira 18, o governador fluminense, Sérgio Cabral (PMDB), acenou com a hipótese de levar o projeto de pacificação para Niterói antes do previsto. “Se as medidas emergenciais não resolverem, nós vamos para a UPP (em Niterói)”, afirmou. É preciso agir para impedir que a escalada da violência manche os bons indicadores sociais e econômicos de Niterói.

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