O Rio de Janeiro é o espelho do Brasil. O que ocorre no Rio de Janeiro fatalmente se transmitirá em cadeia para os outros Estados da Federação. As questões de justiça criminal e ordem pública não fogem desta regra. Portanto, é estratégico manter a atenção, estudar o cenário, analisar as experiências e observar as políticas lá realizadas, ajudando no alcance dos objetivos. A solução desta guerra envolve leis duras e um Sistema de Justiça Criminal integrado, ágil, coativo e comprometido em garantir o direito da população à segurança pública.

segunda-feira, 31 de março de 2014

OCUPAÇÃO DA MARÉ DESBANCA O TRÁFICO


ZERO HORA 31 de março de 2014 | N° 17749


TEXTO HUMBERTO TREZZI IMAGENS FERNANDO GOMES | RIO DE JANEIRO


DE OLHO NA COPA

Disputado há quatro décadas por facções, conjunto de 16 favelas na zona norte do Rio de Janeiro foi retomado pelo poder público. Sem mortes, sem tiros e em apenas 15 minutos, ruiu ontem um império do crime disputado há 40 anos por três facções rivais.


O Complexo da Maré, conjunto de 16 favelas situado na zona norte do Rio, foi ocupado militarmente por 1,5 mil policiais militares, civis e federais, que não encontraram resistência.

Contribuiu para isso uma tática do governo fluminense que vem dando certo: avisaram com antecedência quando a operação seria realizada e que ela não teria volta. Como bons entendedores, traficantes e milicianos que partilhavam a área deixaram o caminho livre para as autoridades. E as bandeiras do Brasil e do Estado do Rio, que há muito não tremulavam na praça central de uma das principais favelas, a Parque Pinheiro, voltaram a ser hasteadas, desta vez em companhia da flâmula da Polícia Militar. Horas após a ocupação, foi registrada a morte de um adolescente, em uma briga de gangues ligadas a facções do tráfico.

A escolha da Maré como alvo da maior operação policial do Brasil em três anos aconteceu em decorrência da sua localização estratégica – está próxima ao Aeroporto Internacional Tom Jobim e entre as três principais vias do Rio, a Linha Amarela, a Linha Vermelha e a Avenida Brasil. As autoridades almejam montar na região um “cordão sanitário” contra o crime, antes da Copa e de seus milhares de visitantes chegarem. Até para mostrar quem manda, o governo anunciou que criará ali várias Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), quartéis de policiamento comunitário que hoje formam um raro consenso entre cariocas de todas as classes.

O outro motivo pelo qual a Maré foi colocada na mira das autoridades é por ser dos raros lugares no Rio que concentra várias facções criminais.


Crime não termina, apenas muda de lugar

Ao ocupar a região, os policiais deram uma porretada no Terceiro Comando Puro (TCP, que controlava 11 das 16 favelas dali), no Comando Vermelho (que mandava nas duas maiores favelas da área, Nova Holanda e Parque União) e ainda em uma milícia formada por policiais e ex-policiais corruptos, que manda nas duas comunidades restantes. De quebra, mostrou que não persegue apenas integrantes do CV, acusação que vinha sendo feita porque 32 das 38 UPPs instaladas até hoje estão em áreas que pertenciam a essa facção. Esse pessoal terá de procurar serviço em outra freguesia, cada vez mais longe dos pontos turísticos ou nevrálgicos do Rio. Fato, aliás, que representa a maior crítica às UPPs até agora: o crime não termina, apenas muda de lugar. A população reivindica mais prisões e não apenas remoção dos alvos. Agências de inteligência teriam informações de que ao menos três chefes do Comando Vermelho teriam fugido para o Paraguai.

Os 1.183 PMs, 183 policiais civis e 50 policiais federais que participaram da ação deram um grande prejuízo aos bandidos. Apreenderam 450 quilos de maconha e prenderam, em pequenas ações conta-gotas ao longo da semana, 118 pessoas suspeitas de ligação com as quadrilhas – 13 delas neste domingo. Mais importante do que isso, deram um recado: o lugar deixou de ser santuário do crime. Dentro de uma semana, 4,5 mil integrantes das Forças Armadas vão substituir as polícias dentro da Maré e permanecerão lá por tempo indeterminado, uma verdadeira intervenção militar. Algo que preocupa muitos moradores, como a dona de casa Tereza Mesquita de Farias, líder comunitária na Vila Pinheiro, uma das 16 ocupadas.

– Espero que não confundam a casa da gente com a dos bandidos. Que não quebrem as coisas quando revistam. Que respeitem os trabalhadores. E que tragam também mais professores e saneamento – resume ela, ao exibir a lista de reivindicações para os novos donos da área, os PMs.



Por terra, pelo ar e pelo mar



O matraquear ensurdecedor das hélices de helicópteros rompeu o silêncio da noite carioca às 5h15min. Eram os Águia da PM, com atiradores de elite nas janelas, e os H1UH da Força Aérea Brasileira, dando apoio ao avanço de mais de 1,2 mil policiais militares e duas centenas de policiais civis pelas estreitas vielas do Complexo da Maré.

A linha de frente foi feita pela tropa de elite do Bope, os “caveiras”, com seus uniformes pretos quase imperceptíveis na escuridão. Em grupos enfileirados, eles saltaram de blindados Piranha da Marinha, especialmente cedidos para a operação. Comunicando-se com sinais e com radiocomunicadores acoplados na cabeça, eles não pararam até atravessar de Oeste para Leste a favela Nova Holanda, a maior a ser ocupada.

A própria Marinha fez a retaguarda, com 200 fuzileiros navais espremidos nos carros de combate, mirando o teto das casas e as lajes de onde poderiam sair tiros dos criminosos. Mas os disparos não vieram, para alívio geral, de policiais, moradores e centenas de jornalistas que acompanhavam a operação. Apenas um que outro estouro de foguete, sinalizando a algum traficante retardatário a chegada das tropas de ocupação. O vaivém dos fardados era observado por moradores, alguns dos quais recém-saídos de rodas de pagode e bailes funk, que teimaram em acontecer mesmo na madrugada anunciada para a ocupação.

Ninguém ficou surpreso com a falta de tiros, nem com as escassas prisões – apenas 13 presos ontem, em uma população de 130 mil pessoas que vivia dominada por mais de 500 bandidos fortemente armados. É que os criminosos saíram antes da ocupação, como tem sido regra antes da instalação de UPPs. Saem, jurando aos parentes que voltarão. Em alguns casos, como na Rocinha e no Complexo do Alemão, voltam mesmo, fazendo emboscadas contra policiais. Desde a primeira UPP instalada, em 2008, 11 PMs dessas unidades foram mortos por traficantes.

A fuga dos bandidos deve ter acontecido ao longo da semana, já que ontem era quase impossível sair da Maré sem ser visto. Todas as entradas do complexo e suas três vias de acesso foram bloqueadas por blindados e PMs, a cada cem metros. Sobraria o mar (a Maré, como indica o nome, é banhada pela Baía da Guanabara). Mas até ali lanchas da Marinha e da PM patrulhavam, tanto que três jovens foram presos à beira-mar, com drogas.

Entre 21 e 29 de março foram apreendidos na Maré sete fuzis, duas metralhadoras, 18 granadas, 33 pistolas e 10 revólveres, além de 15,4 quilos de cocaína, 37,7 quilos de maconha e cinco quilos de crack. Ontem, mais 450 quilos de maconha.

– Fomos muito bem – comemorou o secretário da Segurança do Rio, José Mariano Beltrame.




DIÁRIO DO RIO



Os traficantes do Comando Vermelho oferecem “selo de garantia” aos consumidores da cocaína vendida no Complexo da Maré. O Batalhão de Choque encontrou em uma residência centenas de papelotes embalados e prontos para venda. O detalhe é que em cada um havia uma gravura: no meio, o desenho de um fuzil M-16. Abaixo, as palavras CV e Colômbia.

A ocupação da Maré atraiu jornalistas do mundo inteiro. Só a France-Presse deslocou três equipes. A norte-americana AP, duas. O The New York Times abriu página em tom celebratório, sob o título “Polícia brasileira, amparada por militares, ocupa favela próxima ao Aeroporto do Rio”.

Todo o trabalho dos policiais foi acompanhado pela cúpula da Segurança, ao vivo. Sabe onde estavam muitas das câmeras? Na cabeça dos militares. Algumas unidades trabalharam com óculos especiais, capazes de filmar as ações de combate à noite. É um recurso já usado pelos norte-americanos no Iraque.

- Ao perceberem que não haveria tiroteio, moradores retomaram suas vidas. Uma cozinheira deixou panelas com comida à venda, enquanto PMs passavam nervosos por ali. Um bando de guris foi jogar a pelada dominical, alheio aos “caveiras” do Bope. Ao que parece, houve apenas troca de guarda: saem os traficantes, entram os policiais.

domingo, 30 de março de 2014

QUANTAS LÁGRIMAS

O GLOBO 30/03/2014

Aldir Blanc




A tortura, a morte e ocultação de cadáver do Amarildo cobriram a pacificação de descrédito

Estou me sentindo em avião da Malaysia Airlines, só que há destroços para onde quer que eu olhe. Uma baleada, no Rio, foi posta na mala de um carro e arrastada 200 metros. Os PMs responsáveis eram, supostamente, homens treinados. As perguntas: isso é procedimento padrão para socorrer feridos? Por que jogaram o corpo na mala? Maior conforto da vítima? Para não sujar o banco? E a mala foi deixada aberta por descuido ou para melhorar a ventilação? Um motorista qualificado não percebe que está arrastando uma pessoa? O pilantra da Petrobras que bolou o golpe de Pasadena merece cadeia, mas não vou entrar nesse Fla-Flu porque não vejo sinais dos tucanôs-du-metrrrô serem punidos. Dezenas de pés de chinelo estão na mira da Cega. Cadê a chefia? A coisa vem de Covas, passa por Serra e chega a Alckmin. Faltam muitos indiciamentos de aves bicudonas. Tem ladrão em todo lugar: nos bancos, nas empreiteiras, nas ONGs, nos ministérios da Cultura e dos Esportes, na CBF, no COB, na Fifa... É tanto gatuno nos galhos que as árvores não estão aguentando. Faltam poucos dias para a Copa, e o que vemos? Denúncias de corrupção, apagões, confas em aeroportos, falta d’água, estádios cercados por guindastes, bate-estacas, todo tipo de tralha terceirizada para aumentar o l-u-c-r-o. É impatriótico temer uma catástrofe? Se ocorrer e um carioca citar a tragédia num samba, o crítico paulistano “entenderá” o verso?

O dr. Beltrame dá entrevistas como alguém sitiado. A verdade é que a tortura, a morte e ocultação de cadáver do Amarildo cobriram a pacificação de descrédito. Estamos seguros, dr. Beltrame? Fiquei muito triste quando uma amiga foi morar nos cafundós porque o tráfico da Rocinha requisitou as filhas dela para o harém. O curioso é que, há dez anos, outra amiga da família fugiu de Vilar dos Telles pelo mesmo motivo. E veja as datas, doutor: há quase 40 anos mudei para meu esconderijo e um faz-tudo da rua voltou para o interior. O tráfico ordenara a adesão das gêmeas do trabalhador ao serralho. Comandantes baleados, UPPs incendiadas, ladrões correndo feito baratas. Ligue os pontos, dr. Beltrame: enquanto Mamaluf continuar solto, Lobão for ministro e Sarney passar por reserva moral, o cacete vai continuar comendo, tão certo quanto vão nascer trepadeiras na careca do Réu-nan...

Isabel Diegues fez um lindo curta, baseado no livro que escrevi sobre a infância em Vila Isabel. Paulo Goulart e Nicette Bruno brilharam nos papéis de meus avós. Fui à Bienal do Livro e encontrei o casal. Paulo disse pra Nicette: “Olha o nosso neto!” Me beijaram, abraçaram, me cercaram de tanto carinho que achei que meus avós tinham voltado. Acreditando, só um instantinho, na hipótese de Pascal, quem sabe, no futuro, não tomamos Paulo, meu vô e eu uma vinhaça lusitana dessas de deixar a boca roxa. Paulo e Nicette, além de imensos artistas, são pessoas insubstituíveis. Faço minhas as palavras do grande Manacéa: “Quantas lágrimas eu tenho derramado...”

COMPLEXO DA MARÉ É OCUPADA


Complexo da Maré é ocupado em 15 minutos para a instalação de UPP. Bandeira do Brasil é hasteada na praça que fica entre as comunidades do Timbau e da Vila dos Pinheiros. Operação iniciada na madrugada deste domingo foi realizada sem disparo de tiros. Secretaria de Segurança pede a colaboração de moradores com denúncia sobre criminosos, armas e drogas

O GLOBO 
Atualizado:30/03/14 - 10h53

Policial mostra a bandeira do Brasil para o pequeno morador do Complexo da MaréPablo Jacob / Agência O Globo


RIO - Em uma cerimônia marcada pela paz, na presença de muitas crianças, a bandeira do Brasil foi hasteada no Complexo da Maré, por volta das 9h40m, na praça que fica entre as comunidades do Timbau e da Vila dos Pinheiros. No local será montada a base provisória do Batalhão do Choque. Durante coletiva no Centro Integrado de Comando e Controle (CICC), o governador Sérgio Cabral falou sobre a retomada das favelas, ocorrida em 15 minutos e sem o disparo de tiros. Para ele, este é um dia histórico:

— A Maré é quase uma cidade, se pensarmos que 80% dos municípios brasileiros não têm a quantidade de pessoas que existe lá. Nos últimos 40 anos, aquelas favelas estavam desamparadas pelo poder público e cresciam, cada vez mais, no entorno da Avenida Brasil, das linhas Amarela e Vermelha, do Galeão, do Fundão e com a Fiocruz bem ali em frente. Não podíamos mais tolerar esse domínio do poder paralelo. Hoje foi um dia histórico.

As forças de segurança do Rio ocuparam o Complexo da Maré, no fim da madrugada deste domingo. As favelas da região foram recuperadas pelo Comando de Operações Especiais da Polícia Milita e não houve resistência. Os agentes permanecem nas comunidades, nesta manhã, em operações de buscas de criminosos e apreensões de armas, drogas e objetos roubados.

Na Vila dos Pinheiros, na Maré, poucas pessoas andavam pelas ruas, no início da manhã. Policiais do Batalhão de Choque revistam carros no interior da favela, mas o clima é de aparente tranquilidade no local. Na Nova Holanda, os moradores acompanharam das janelas e das portas de casa a chegada dos veículos blindados da Marinha. Na Rua Teixeira Ribeiro, um dos principais acessos da Nova Holanda, alguns feirantes montam normalmente suas barracas de frutas.

— Temos que trabalhar. Acho que o movimento será pequeno, mas está tudo calmo — disse um feirante, que não quis se identificar.

Um outro morador, que também não quis se identificar, contou que muitos bandidos já deixaram as favelas do Complexo da Maré, desde a sexta-feira da semana passada. Além dos veículos blindados, policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope) também circulam a pé pelas ruas da favela, alguns acompanhados de cães. A ocupação também é acompanhada por jornalistas da imprensa internacional.

— Desde que foi falado que a polícia ia ocupar a favela ficou mais tranquila. Estou confiante que as coisas vão ficar melhor ainda — disse um outro morador.

Já a dona de uma barraca de comidas, que também não se identificou, lamentou o fim do baile funk na Nova Holanda:

— Em dias de baile, eu fazia 22 panelas de comida. Ontem, eu fiz 16 e ainda não consegui vender tudo.

Na Vila dos Pinheiros, homens da cavalaria da PM fazem uma montaria levando uma bandeira do estado. Eles circulam pela comunidade, num momento simbólico da ocupação. Ao todo, a PM atua com 1.180 homens no complexo de favelas da Zona Norte. Pelo menos cinco pessoas já foram presas, incluindo policiais militares do Rio, e drogas e armas apreendidas, durante operação da Polícia Federal para desarticular, na manhã desta domingo, a quadrilha de Marcelo Santos das Dores, o Menor P., chefe do tráfico de 11 favelas no Complexo da Maré. O bandido foi preso também pela PF na última quarta-feira em Jacarepaguá. Estão sendo cumpridos 15 mandados de prisão e de busca e apreensão na Região Metropolitana do Rio. A operação é parte do processo de pacificação da Maré, ocupada hoje em ação conjunta das forças de segurança federal e estadual.

A Secretaria de Segurança solicita a colaboração dos moradores das comunidades que formam o Complexo da Maré, com denúncia sobre criminosos, esconderijos e locais onde possam estar guardadas armas, drogas, objetos roubados e outros produtos ilegais. Os moradores podem ligar para o Disque-Denúncia (2253-1177) ou para o 190 da PM.

Além disso, todos os moradores devem andar com documentos de identificação e os motoristas e motociclistas serão solicitados a mostrar documentos de propriedade de seus veículos, bem como a Carteira Nacional de Habilitação em dia. No caso das motos, também será exigido o uso de capacete.

A Força de Fuzileiros da Esquadra da Marinha participa da Operação na Maré com 250 homens, prestando apoio logístico de transporte para os batalhões de Operações Especiais e de Choque. Os militares, que entraram nas comunidades a bordo de 21 veículos blindados, têm experiência em Missões de Paz no Haiti e em outras operações de apoio à Secretaria de Segurança, como no complexos da Vila Cruzeiro e do Alemão, e nos morros São Carlos, da Mineira, Mangueira, Rocinha, Vidigal, Chácara do Céu, Chatuba, Manguinhos e Jacarezinho, comunidades da Barreira do Vasco e do Caju, além do Complexo do Lins.

Na operação deste domingo são utilizados cinco carros blindados sobre Lagartas M-113, seis carros Lagarta Anfíbio (CLAnf) e dez blindados sobre rodas para garantir a mobilidade das forças policiais em todas as comunidades do Complexo da Maré.

Cabral sobre a ocupação da Maré: 'Hoje foi, sem dúvida, um dia histórico'. Governador destaca, ainda, que a colaboração da presidente Dilma foi essencial para o sucesso da ação

ADALBERTO NETO
O GLOBO
Atualizado:30/03/14 - 10h52

Sérgio Cabral participa de reunião após ocupação da Maré Divulgação


RIO - Após a retomada do Complexo da Maré, o governador Sérgio Cabral falou, na manhã deste domingo, sobre a entrada das forças de segurança nas favelas da região, ocorrida em 15 minutos e sem o disparo de tiros. Para eles, este é um dia histórico:

- Nos últimos 40 anos, aquelas favelas estavam desamparadas pelo poder público e cresciam, cada vez mais, no entorno da Avenida Brasil, das linhas Amarela e Vermelha, do Galeão, do Fundão e com a Fiocruz bem ali em frente. Não podíamos mais tolerar esse domínio do poder paralelo. Hoje foi, sem dúvida, um dia histórico - declara Sérgio Cabral.

O governador destacou, ainda, que a ocupação da Maré já estava prevista, porém, foi antecipada por conta dos últimos acontecimentos:

- Nos últimos três meses o poder paralelo vem tentando nos intimidar e, assim, provocar o enfraquecimento da nossa política de pacificação vitoriosa. Por isso, na madrugada de quinta para sexta da semana passada, foi pensado um plano de ação de combate - afirma Cabral.

Cabral também agradeceu a colaboração da presidente Dilma Rousseff e o desempenho das polícias Militar, Civil, Federal e Rodoviária Federal, do Exército, Marinha, Aeronáutica, Corpo de Bombeiros e da Prefeitura do Rio.

- O trabalho em conjunto de todos os órgãos foi essencial. E a presidente Dilma foi primordial para todo este processo acontecer, já que ela atendeu aos meus pedidos prontamente. Solicitei uma reunião emergencial na sexta da semana passada, e na segunda já estávamos bolando o nosso plano de ocupação - explica.

O governador também destacou a dimensão do complexo, que tem cerca de 120 mil habitantes.

- A Maré é quase uma cidade, se pensarmos que 80% dos municípios brasileiros não têm a quantidade de moradores que existe lá. E todos eles estavam privados dos serviços públicos mais básicos, como os Correios, Comlurb, Corpo de Bombeiros e Rioluz, antes impedidos pela ocupação do tráfico.

450 KG DE DROGAS APREENDIDAS E 60 PRESOS

ZERO HORA 30/03/2014 | 08h22

Polícia realiza prisões e apreende 450 quilos de drogas durante ocupação do Complexo da Maré, no Rio. Somadas todas as detenções desta semana, são cerca de 60 criminosos tirados de circulação



Blindados das Forças Armadas adentraram ruas da favela Nova HolandaFoto: Fernando Gomes / Agência RBS


Humberto Trezzi e Fernando Gomes, enviados especiais ao Rio de Janeiro


Duas ações simultâneas, da Polícia Federal (PF) e das polícias estaduais, desestabilizaram as organizações criminosas que controlavam até esta semana as 16 favelas do Complexo da Maré, na zona norte do Rio de Janeiro. O movimento principal foi feito por 1.183 PMs e 183 policiais civis, que ocuparam aquelas comunidades, de norte a sul.

Nas proximidades da Baía de Guanabara, o lado da Maré que dá para o mar, agiu a PF. Os federais, mediante denúncia recebida, localizaram dentro de bueiros um paiol (depósito) dos traficantes do Terceiro Comando Puro (TCP), a maior das facções da região. Nele foram encontrados mais de 450 quilos de maconha e alguns quilos de cocaína, embalados em pacotes de um quilo cada. Foram também localizados fuzis e pistolas.

Já o Batalhão de Operações Especiais da PM (Bope, conhecido como Tropa de Elite), realizou pelo menos três prisões de jovens que portavam cocaína para venda. Eles foram algemados e levados para a Delegacia de Polícia Civil de Bonsucesso (21ª DP).

Ao longo da semana, o Bope, o Batalhão de Cães e o 22º BPM (batalhão que patrulha a região da Maré) prenderam outras 57 pessoas por tráfico. A ação dos PMs é seguida pela de policiais civis, munidos de mandados judiciais de busca e apreensão coletivos — que permitem revistar várias residências de uma vez ou pertencentes a uma mesma pessoa. Um total de 21 delegados da Polícia Civil participa da ação.

A ação dos policiais estaduais e federais do Rio é amparada por 21 blindados da Marinha, os carros de combate Piranha. Mais de 250 fuzileiros navais se postaram em pontos nevrálgicos das favelas Nova Holanda e Parque União, as principais da Maré, bloqueando eventuais fugas de traficantes.

Nenhuma confusão foi registrada, nenhum tiro foi disparado até as 8h. A Força Aérea Brasileira também participa da operação, com helicópteros H1UH (Huey), que informam do alto a possível movimentação de bandidos, e com um drone (avião não-tripulado) munido de câmeras de vídeo de longo alcance.

Polícia ocupa o Complexo da Maré
Patrulha na favela Nova Holanda


PACIFICADO OU CONFLAGRADO?


ZERO HORA 30 de março de 2014 | N° 17748

TEXTO HUMBERTO TREZZI IMAGENS FERNANDO GOMES

DILEMA DO RIO


Correu o mundo a imagem de dezenas de bandidos em fuga, deixando cair armas, dias antes da ocupação do Complexo do Alemão pelas Forças Armadas, em 2010. Criminosos que exibiam um arsenal para os fotógrafos e fustigavam a tiros os PMs que ousassem se aproximar. Pois a ocupação aconteceu, o Exército ficou dois anos nas 13 favelas da região e o cenário, agora, não poderia ser mais diferente. Para melhor.

Saíram de cena os criminosos armados – é possível passear pelas 13 favelas, sem ver nenhum. O Alemão ganhou um sistema de teleféricos cujos bondinhos percorrem quatro morros do complexo, facilitando – e como! – a vida dos moradores.

Que o diga Juarez Ferreira, o Juarez Sukita, mestre de capoeira que passa os dias a ensinar a técnica de dança-luta para cem alunos das favelas. Um curso disputadíssimo. Aos 60 anos, ele desfruta agora dos bondinhos coloridos para subir os morros do Adeus e Alemão.

– Faço isso em 10 minutos, quando antes levava mais de uma hora. Melhorou 200% – elogia.

Os bondinhos são uma das promessas cumpridas pelo governo federal. Já o estadual e a prefeitura colocaram, além de quatro UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), agências bancárias, postos policiais da Mulher e do Idoso, postos dos Correios e da Previdência Social. Ruas foram pavimentadas e também foi melhorada a rede de esgoto. Tudo isso viabilizado após a implantação das UPPs, bases policiais comunitárias que resgataram para o Rio territórios imensos que estavam sob controle da bandidagem.

Pois a implantação desses Territórios da Paz, que especialistas consideram como a mais importante novidade na segurança pública brasileira nas últimas décadas, está em xeque. Ataques de bandidos a UPPs (foram sete este ano) deixaram quatro policiais mortos, em investidas ordenadas desde os presídios. Desde que a primeira dessas bases comunitárias foi inaugurada, em 2008, 11 PMs que nelas trabalhavam foram assassinados, em represália contra a retomada de seus territórios pelo Estado.

Os atentados, que parecem mirar alvos aleatórios – alguns PMs são fuzilados na saída do serviço, outros mortos a tiros quando passam na rua – derivam do choque de dois conceitos. De um lado está a proposta de reocupação de território pelo Estado, após décadas em que as favelas se viram abandonadas. No outro espectro do campo de batalha estão os bandidos sociais, que existem há décadas no Rio. Líderes violentos que garantem popularidade com pagamento de enterros, auxílio-nascimento, em um modelo de assistencialismo. É uma queda de braço na qual os bandidos, desde 2008, vêm perdendo terreno.

Complexo da Maré virou QG de facções

É por isso que, em um contra-ataque governamental, neste fim de semana mais de mil PMs devem marchar pelas vielas do Complexo da Maré, conjunto de 16 favelas controladas por duas facções.

A Maré foi escolhida por dois motivos: está próxima ao Aeroporto Internacional Tom Jobim e entre as três principais vias do Rio, a Linha Amarela, a Linha Vermelha e a Avenida Brasil, e se tornou o maior reduto do Comando Vermelho, mais importante facção criminal fluminense. É gente armada com joias da indústria bélica: lança-foguetes, bazucas e fuzis de vários tipos.

Pois esse arsenal, em mãos tanto de integrantes do Comando Vermelho (CV) quanto de seus rivais do Terceiro Comando Puro (TCP), é usado em quase todos os ataques – a maioria realizada pelo CV, que tem ingerência sobre 32 das 38 áreas em que foram implantadas UPPs.

A ofensiva dos traficantes acontece no momento de maior impopularidade das UPPs – e aí pode não ser mera coincidência. Episódios como a tortura e morte de um suspeito no posto policial da Rocinha e a prisão por extorsão de policiais da UPP da Mangueira minaram a imagem até então impoluta das “unidades pacificadoras”.



“O que tu tá filmando?”



Quinta-feira, 27 de março, 20h – A equipe de Zero Hora percorre o Dona Marta, morro da Zona Sul onde foi instalada a primeira UPP do país. É um dos mais íngremes montes do Rio, um maciço rochoso com uma vista de tirar o fôlego, de frente para a Baía de Botafogo. Pena que é noite. A escolha por um passeio noturno se deu justamente para verificar se, como no passado, os traficantes ainda barram estranhos que se atrevam a ingressar na favela.

O começo do passeio é animador. Subimos a ladeira bem iluminada. Donas de casa e feirantes pechincham o preço dos legumes, aos gritos. Jovens casais de turistas, falando inglês, percorrem as vielas rumo a dois bares que estão lotados, animados por roda de samba de raiz. Ladeira acima cresce a escuridão, até um elevador que leva ao topo do morro e onde fica a UPP. Tranquilidade total.

Começamos a fotografar e filmar, narrando o passeio – algo que representaria suicídio, anos atrás, pela contrariedade que isso traz aos traficantes. Logo percebo que a situação não mudou tanto assim. Estou descendo a rua quando um sujeito forte encosta ao meu lado e fala alto:

– Que tu tá filmando, rapaz?

Desgrudo o olhar do visor e respondo para ele:

– A feira, a roda de samba. Por quê?

O rapaz continua a ladainha:

– Com permissão de quem? Tu vai te incomodar, tu vai te incomodar...

Ato contínuo, ele vira para outros rapazes sentados na calçada, de bermuda e tênis de marca, e grita:

– Ele tá filmando, tá filmando.

Os rapazes levantam. Ainda bem que estou próximo aos bares. Dou um jeito de me misturar aos fregueses e, assim que posso, saio do local e desço o morro. Sempre vigiado.

Nos anos 80, facção tinha até assessoria

Para quem vai a primeira vez, essa pode ser uma situação incômoda. Mas já foi bem pior. Em 1987, o Brasil inteiro assistiu pela TV a batalha de quase duas semanas entre duas quadrilhas do Dona Marta, uma liderada pelo traficante Zaca (ex-PM) e outra por Cabeludo. Trocavam tiros à luz do dia, em frente às câmeras dos jornalistas. Tinham até uma assessora de imprensa, a Carlinha, que desfilava com dois revólveres na cintura.

Em 1995, ZH estava ao pé do Dona Marta quando começou um tiroteio. Metralhadoras antiaéreas, daquelas com cinturão de balas, disparavam para o céu projéteis traçantes, capazes de atravessar vários barracos. Perto disso, o cenário agora é paradisíaco. Pelo menos não vimos armas.

A ausência do armamento entre os traficantes do Dona Marta é, justamente, o que leva a antropóloga Alba Zaluar, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) – uma das maiores estudiosas de crimes no país – a defender a implantação das UPPs.

– Apesar das carências, as UPPs deram certo, especialmente em favelas da Zona Sul. Hoje, elas abrem restaurantes, bares, pousadas, onde antes só havia o tráfico como empregador. A ocupação, como a que será feita na Maré, tem mérito por tirar as armas de circulação. Depois o Estado tem de complementar com investimento social – analisa Alba.



Ataques e assassinatos gestados em presídios

Um relatório da Polícia Civil aponta que os atentados contra UPPs foram ordenados pelo traficante Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, que está em um presídio federal. Ele é aliado do famoso Fernandinho Beira-Mar, preso desde 2001.

A determinação teria sido executada pelos traficantes José Benemário de Araújo, Claudio Fontarigo (o Claudinho da Mineira), Ricardo Chaves de Castro Lima (Fu), Bruno Eduardo da Procópio (o Piná), Adauto Gonçalves (o Pit Bull) e Luciano Martiniano da Silva (o Pezão), após encontros no Morro do Chapadão (em Costa Barros) e Antares (em Santa Cruz), subúrbios do Rio. Sem dar nomes, o secretário da Segurança José Mariano Beltrame confirma a jornalistas que a ordem para ataques partiu de traficantes presos.

Operação do Bope antecipa ocupação

Como resposta do Estado, o governo do Rio anunciou, na semana passada, que o Complexo da Maré será ocupado por militares das Forças Armadas e pela Força Nacional de Segurança. Conforme informações da inteligência policial, é de lá, onde vivem 130 mil pessoas, que partem os criminosos responsáveis pelas ações. A operação, marcada para acontecer no dia 7 de abril, foi antecipada. Na sexta, o governo anunciou que soldados do Bope farão uma investida neste domingo, preparando o terreno para a ocupação.


Propina e tortura mancham imagem


Na última semana, soldados do 22º Batalhão de Polícia Militar quebraram objetos durante revista de casas no Complexo da Maré, como ZH constatou. Mulheres choravam enquanto eles faziam a busca de drogas e armas, não encontradas.

Na Zona Oeste, PMs do 9º BPM mataram um suspeito de tráfico – sob tortura, dizem testemunhas – e, furiosos, populares descontaram a raiva incendiando carros de motoristas que passavam pela Vila Vintém. São desse mesmo batalhão os policiais que deixaram cair no asfalto uma mulher ferida que era transportada no porta-malas de uma viatura, fato gravado em vídeo por populares.

Foi justo para evitar episódios desse tipo que a PM fluminense criou as UPPs. A ideia é que os policiais não sejam vistos como tropa de ocupação, mas como parceiros da comunidade. Tanto que todos os escolhidos para servir nas unidades de pacificação são recrutas novatos e, teoricamente, imaculados.

Pois três episódios recentes mancharam a imagem das UPPs no Rio, que até então tinham popularidade suficiente para eleger e reeleger governadores. O primeiro foi a descoberta de um esquema de “mesada” que seria paga por traficantes dos morros do Fallet e do Fogueteiro, na área central da cidade, ao comandante da UPP local, que foi afastado em 2012.Foram afastados 30 policiais dali, suspeitos de faturarem R$ 52 mil mensais em propina.

A segunda revelação, também em 2012, foi de que PMs da UPP da Mangueira teriam exigido o pagamento de R$ 3,5 mil de um homem em cuja casa foram apreendidas droga e dois celulares. A suspeita levou à prisão de 12 policiais, que já estão soltos, mas foram removidos e respondem a processo.

A terceira e mais polêmica mancha é o sumiço do pedreiro Amarildo de Souza, suspeito de tráfico, detido por policiais da UPP da Rocinha. Ele sumiu há mais de seis meses. Testemunhas dizem que foi torturado até a morte. Dez policiais envolvidos no caso estão presos até hoje.

Quase meio milhão em cocaína e crack

A última e péssima notícia sobre UPPs saiu esta semana. Policiais civis da 45ª DP estouraram quarta-feira um laboratório de cocaína na Fazendinha, no Complexo do Alemão. Foram apreendidos 15 quilos de cocaína, 730 pedras de crack e 15 litros de lança perfume, material avaliado em R$ 450 mil. A estranheza acontece porque desde 2010, segundo o governo, o Alemão estaria livre do tráfico pesado – então o que faziam escondidos ali quase meio milhão de reais em drogas? É um tiro na imagem das UPPs, pois esse conjunto de 13 favelas é o que reúne mais unidades pacificadoras, quatro.

– O problema das UPPs, uma boa iniciativa, é que os policiais escolhidos para ela já começam a ser contaminados pelos vícios da PM fluminense, historicamente envolvida com torturas e assassinatos – pondera o sociólogo e jornalista Marcos Rolim, especialista em segurança pública.

Mesmo com o crescente envolvimento de policiais de UPPs em suspeita de crime, é certo que eles ainda estão acima da média, no quesito honestidade.


sábado, 29 de março de 2014

AÇÃO FEDERAL MOBILIZA 1.800 HOMENS LIDERADA PELA BRIGADA PARAQUEDISTA


28/03/2014 17h25


Exército entrará na Maré no dia 5, após ação das polícias domingo. Ação federal vai mobilizar até 1.800 homens e será liderada pela Brigada Paraquedista

RAPHAEL GOMIDE


O Complexo da Maré, no Rio de Janeiro. A ação do exército começa no domingo (5) (Foto: Márcia Foletto/ Agência O Globo)
O Complexo da Maré, no Rio de Janeiro. A ação do exército começa no domingo (5) (Foto: Márcia Foletto/ Agência O Globo)


Na semana passada, o governador do Rio, Sérgio Cabral, pediu ajuda das Forças Armadas, em meio à crise provocada pelos ataques de criminosos a policiais e UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora). A resposta do esforço conjunto estadual e federal começará efetivamente na madrugada deste domingo, com a ocupação do Complexo da Maré, em 15 favelas. Diferentemente do que se esperava, caberá às polícias Militar e Civil do Rio a primeira grande operação de tomada na região, habitada por 130 mil pessoas, e não ao Exército.

O Exército só chegará para assumir o controle do complexo no dia 5 de abril. Inicialmente, as tropas da Força Terrestre deverão ficar na Maré até julho, mês da Copa do Mundo. Há, no entanto, a possibilidade de permanecerem até o final do ano – o Exército duvida que o período se resuma aos quatro meses. A Brigada de Infantaria Paraquedista, unidade de elite e de pronto-emprego do Comando Militar do Leste, vai liderar a primeira fase. Cerca de 1600 a 1800 soldados devem ser mobilizados, até a PM conseguir implantar uma UPP no local, com 1.500 policiais.

Neste domingo, as unidades estaduais empregadas na reconquista da Maré para o Estado serão o Bope, o Batalhão de Choque, o Grupamento Aeromóvel e o Batalhão de Ações com Cães, além da Polícia Civil, com apoio da Polícia Rodoviária Federal. Trata-se de uma ação “interagências”, no jargão militar. O aparato no terreno deve reunir 1100 agentes. Para penetrar no conjunto de favelas, os policiais vão contar com oito a dez veículos blindados dos Fuzileiros Navais e lanchas, emprestados da Marinha, repetindo o modelo de sucesso das ações nos complexos do Alemão/Penha e na Rocinha.

Patrulhas do Bope já operam na Maré, e os paraquedistas fizeram voos de reconhecimento. A inteligência não acredita em resistência e já identificou a fuga de criminosos. Na quarta, a Polícia Federal prendeu o principal chefe do tráfico na região, Marcelo Santos das Dores, o Menor P, em Jacarepaguá, e a Polícia Civil apreendeu 15 quilos de pasta-base de cocaína na Maré. Embora o anúncio político da ocupação seja criticado internamente, policiais viram a medida como uma demonstração de força do Estado brasileiro. Os resultados positivos já podem ser vistos: o fim dos ataques às UPPs e a fuga de traficantes da Maré, reduto de criminosos da maior e mais violenta facção criminosa do Rio. Os próximos passos começam domingo, com a retomada da Maré pelo Estado, com as polícias, e depois, com o Exército.

RIVALIDADE E PREOCUPAÇÃO


ZERO HORA 29 de março de 2014 | N° 17747


SUA SEGURANÇA | Humberto Trezzi



Existem duas razões para que a PM antecipe a ocupação do Complexo da Maré, formado por 16 favelas situadas na zona norte do Rio de Janeiro. A primeira é a velha rivalidade entre fardados: o Exército tinha previsto ocupar a área dia 7, em combinação com o governo do Estado.

Ao chamar as Forças Armadas, o governador – mesmo que involuntariamente – melindrou os brios dos PMs fluminenses, que fazem no cotidiano o patrulhamento da conturbada região da Maré, onde informes de inteligência estimam que vivam mais de 500 bandidos do Comando Vermelho e do Terceiro Comando Puro, as maiores facções criminais cariocas.

Desde que se anunciou no último domingo que as Forças Armadas vão ocupar o Complexo da Maré em abril, é sintomático que tenham aumentado as ações da PM naquele bairro. E como aumentaram. Não passa um dia sem que diversas unidades policiais façam incursões favela adentro.

Buscas e apreensões de drogas e armas foram feitas pelo Batalhão de Guardas e seus cães, Batalhão de Operações Especiais – o temido Bope – 22º Batalhão de Polícia Militar (BPM) e até a tropa de elite da Polícia Civil, a Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), que se distingue dos outros agentes civis por usar uniformes. Hoje, mesmo esses policiais civis estão na Maré.

Natural que a PM se disponha a colocar seus mil homens numa ocupação já neste domingo, antecipando em uma semana a chegada dos 4 mil militares do Exército (ação que também está mantida).



SUBINDO A MARÉ. Forças ocuparão o complexo amanhã

Na zona norte do Rio de Janeiro, policiais farão operação simultânea em pelo menos 16 favelas



Cerca de mil homens de batalhões especializados da Polícia Militar (PM) ocuparão, no fim da madrugada de amanhã, as favelas do Complexo da Maré, zona norte do Rio de Janeiro. Os policiais terão o apoio de blindados da Marinha e veículos aéreos não tripulados (Vants) da Força Aérea Brasileira (FAB) e da Polícia Federal (PF).

Helicópteros da PM também serão utilizados na incursão – inclusive o modelo blindado, conhecido como “Caveirão do Ar”. Participarão PMs do Batalhão de Operações Especiais (Bope), a tropa de elite da corporação, além de agentes dos batalhões de Choque e de Ações com Cães, e do Grupamento Aeromóvel. A PF vai ajudar com informações de inteligência. Já a Polícia Rodoviária Federal vai realizar batidas nos principais acessos, como a Avenida Brasil e as linhas Vermelha e Amarela, para evitar a fuga de criminosos.

As forças de segurança entrarão simultaneamente nas 16 favelas da Maré, assim que o dia começar a clarear. Como já ocorreu nas ocupações de outras grandes favelas da cidade (como Alemão e Rocinha), os primeiros a ingressar nas vielas serão os blindados da Marinha, que conseguem transpor barricadas.

Depois que o território passar para o controle das forças de segurança, os blindados da Marinha sairão. Apenas os PMs vão permanecer na região.


sexta-feira, 28 de março de 2014

ENXUGANDO GELO



O Estado de S.Paulo 28 de março de 2014 | 2h 06


EDITORIAL

Os ataques de bandidos contra policiais das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) em favelas do Rio de Janeiro nos últimos dias mostram que a "pacificação" desses aglomerados urbanos, cantada em prosa e verso pelos governos estadual e federal, só se realiza enquanto o crime organizado permite. A impotência do Estado fluminense ante a força dos narcotraficantes, a despeito de toda a propaganda em torno das UPPs, fica ainda mais patente quando a saída encontrada é, mais uma vez, o despropositado apelo às Forças Armadas.

Para justificar a presença dos militares, o secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, afirmou que a capital enfrenta "problemas de guerra". Segundo sua lógica, a própria existência de um conflito armado mostra que "nossa política está certa" e que o tráfico "está perdendo força". Os policiais mortos pelos traficantes que o digam.

Quase seis anos depois da instalação das primeiras UPPs, tidas pelo governo estadual como a solução definitiva para a segurança pública do Rio, tal escalada de violência deveria pertencer ao passado. O fato, porém, é que a indecisão do Estado em agir efetivamente contra o narcotráfico, preferindo atitudes cosméticas, transformou a política de "pacificação" no equivalente a enxugar gelo: funciona somente o tempo necessário para que os criminosos se reorganizem. E então recomeça o ciclo de violência, repressão militar e ocupação dos morros, o que rende boas fotos - e eventualmente votos -, mas não efeitos duradouros.

O renovado ciclo de violência indica que a "pacificação" não integra uma estratégia de longo prazo. Graças à fraqueza do poder público, que hesita em ir até o fim no combate ao crime organizado, os bandos de narcotraficantes rapidamente se adaptam à presença dos policiais nas UPPs, que por sua vez não afeta o fluxo das drogas e do dinheiro. Enquanto isso, a frouxa repressão à venda de entorpecentes morro abaixo, nos bairros ricos do Rio, sugere que o crime continuará a ter financiamento farto, podendo armar-se com equipamentos tão bons ou melhores do que os da polícia, além de corromper políticos e policiais.

A isso se deve somar o fato de que o governo não complementa a pacificação com uma política sustentável de recuperação social das favelas. Não se dá o sentido de comunidade a um lugar em que o esgoto corre a céu aberto, a moradia é precária, não há serviços essenciais e está à mercê de bandidos e de policiais corruptos - ainda que por perto haja uma UPP com um punhado de policiais bem-intencionados. A descrença no poder público frutifica nesse terreno, levando os moradores a aceitar a proteção e a estabilidade oferecidas pelos chefões do tráfico. E o atual confronto mostra que, nos morros "pacificados", quem segue dando as cartas são as facções criminosas, razão pela qual o governo do Estado pediu ajuda do Exército.

A entrada dos militares nos morros e nas favelas, como a história já demonstrou exaustivamente, é tão inútil quanto perigosa. Pode-se imaginar o escândalo que surgirá quando tombar o primeiro civil morto por um soldado do Exército, ainda que este tenha agido em legítima defesa. Não há prevenção que mude o fato de que as Forças Armadas são treinadas para agir em ambientes em que não se costuma dar voz de prisão ao inimigo.

Em razão disso, para atacar os narcotraficantes, as Forças Armadas teriam de estar amparadas por decreto de intervenção federal, instrumento que lhe daria a chefia da missão. Sabe-se, porém, que o Exército será apenas força auxiliar nessa tentativa de ocupar momentaneamente um território hostil - como se as favelas fossem meros encraves estrangeiros que incomodam, de tempos em tempos, a pax carioca.

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que o Exército vai permanecer "o tempo que for necessário" nas favelas conflagradas. O repto do ministro, porém, não muda o fato de que os soldados logo se retirarão e então tudo voltará a seus lugares, sem que, mais uma vez, os principais problemas que originaram a violência sejam sequer tocados.

NOVO RUMO PARA UPPs



Combater o crime não significa ver todo morador de favela como inimigo potencial

JUNIOR PERIM
O GLOBO:28/03/14 - 0h00



Só o Estado pode — de forma legitimada e pautada nos direitos individuais e coletivos e na absoluta e inequívoca proteção à vida — exercer a autoridade pela força.

Neste sentido, parecem-me equivocados quaisquer debates que visem, tão somente, detonar o controle, pelo Estado, de quaisquer territórios, diante dos últimos conflitos ocorridos em favelas alcançadas pelas Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs).

Não me afilio às ideias que visam a transformar este momento de crise em mote para debates que permitam um retrocesso ou a fragilização deste pressuposto básico da autoridade. Somos uma sociedade moderna e democrática, onde uma crise não pode servir somente de elemento retórico para quaisquer forças políticas e sociais viabilizarem o seu desejo de controle da máquina pública. Não com um direito social tão caro aos diferentes estratos e segmentos da sociedade — a segurança.

Por outro lado, preocupa-me que o Estado reaja aos últimos acontecimentos apenas criando estratégias de incremento da máquina repressiva e do poder de ação ostensiva da polícia em favelas, sem fazer qualquer discussão sobre a ampliação da participação, especialmente dos moradores desses territórios, em planejamento, execução e controle social da política de segurança adotada para eles.

É preciso também colocar na agenda a construção de mecanismos que evitem ações ostensivas e operações policiais que desrespeitem e não protejam a vida. Não devemos tolerar ataques que ceifam a vida de jovens policiais, em sua maioria de origem popular. E enfrentar e combater o crime não pode significar adotar uma lógica truculenta de guerra que vê todo morador de favela como inimigo potencial. Esta prática pode pintar com sangue extensões cada vez maiores do chão da cidade e nos deixar a todos envergonhados de pisá-lo.

Por fim, acho que a crise é um momento para o Estado assumir a vanguarda do debate sobre a imperiosa e necessária reforma da arquitetura do programa das UPPs. Uma das medidas é evitar que um oficial da polícia seja o mediador e a principal autoridade presente nas UPPs. Isso cria uma espécie de “polícia de comportamento”, que tem gerado graves consequências, entre as quais o desrespeito aos direitos individuais e coletivos dos moradores de favelas.

Estou certo de que cada canto do Rio de Janeiro só estará em nossas mãos quando o Estado detiver sobre ele o controle, com a ampla participação social sob a forma de um pacto entre atores públicos e privados dispostos a disputar, palmo a palmo, os territórios favelizados, ganhando-os para o conjunto da cidade. Isso por meio de ações que mobilizem sua força criativa e produtiva, gerando fluxos de interação entre eles e diferentes estratos sociais. Tem um monte de gente (de dentro e de fora das favelas) fazendo e disposta a esses gestos que precisam ser maximizados.

Assim, vamos afirmar as favelas como cidade e realizar a necessária transição da Unidade de Polícia Pacificadora para a Unidade de Política Pública.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - As forças policiais só tratam bandidos como "inimigos", mas como "criminosos" que a lei manda deter. As forças policiais tratam os moradores em locais dominados pelo crime como  vítimas e reféns dos criminosos. É um estereótipo que precisa ser descartado por quem quer estudar a questão de segurança nestes locais onde o poder paralelo impõe a lei do terror. Quanto à conclusão deste artigo, seria bom alertar o autor que  Estado (no caso os três poderes) precisa tratar a segurança pública como uma questão de justiça criminal e não política. As ações políticas administrativa inseridas em serviços públicos de qualidade complementam na conquista dos moradores para liberar das amarras e fortalecer as ações policiais e de justiça no local.

MORADORES DA MARÉ ESPERAM RECEBER BENEFÍCIOS SOCIAIS


Líderes comunitários temem que UPP não traga melhorias em saneamento, saúde e lazer à comunidade

WALESKA BORGES
O GLOBO
Atualizado:26/03/14 - 10h04

Ruas tomadas pelo lixo: queixa comum no Complexo da Maré Márcio Alves / Agência O Globo


RIO — Líderes comunitários das associações de moradores do Complexo da Maré não creem que só a chegada da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) trará benefícios sociais à região. Eles dizem que as favelas precisam também de melhorias no saneamento, lazer, saúde, eletricidade e coleta de lixo. Alguns representantes dos moradores dizem que o anúncio da instalação da UPP aumentou o clima de tensão no local.

Para o vice-presidente da Associação dos Moradores do Parque União, Carlos Alberto Pereira da Silva, o principal problema é o esgoto. Ele ainda se queixou de não haver espaço para as crianças praticarem esportes e da falta de médicos nas unidades de saúde.

— Os governos não costumam ter os olhos e braços abertos para a comunidade. Quase sempre somos esquecidos — disse Silva.

A presidente da Associação de Moradores da Nova Holanda, Andrea Matos, ressaltou que os postos de saúde funcionam de forma improvisada nos Cieps e que as escolas não têm horário integral. Para ela, os benefícios dependem de vontade política:

— Se os políticos não quiserem, nada melhora aqui.

Já um representante da Associação de Maradores do Parque Rubem Vaz, que pediu para não ser identificado, disse que falta uma boa área de lazer para as crianças:

— A Vila Olímpica fica em uma região de outra facção, e as crianças daqui não podem brincar lá. Não acredito que a UPP mudará essa situação.

Outro líder comunitário da Associação dos Moradores do Parque Maré, que também não quis se identificar, disse ainda que a comunidade sofre com o lixo nas ruas e a presença de viciados em crack.

TROPAS MILITARES COM MANDADOS DE BUSCA COLETIVOS


Fuzileiros navais têm mapeamento completo da Maré, diz procuradora. Representante do Ministério Público Militar afirma que tropas contarão com mandados de busca coletivos

SÉRGIO RAMALHO
WALESKA BORGES
O GLOBO
Atualizado:26/03/14 - 7h30

Policiais apreenderam nesta terça-feira 50 quilos de maconha em prédio usado para embalar droga - Gabriel de Paiva / Agência O Globo


RIO — A procuradora Hevelize Jourdan, do Ministério Público Militar (MPM), disse nesta terça-feira que os fuzileiros navais já têm um mapeamento completo da Maré, incluindo as facções criminosas que atuam na região. Segundo ela, as tropas das Forças Armadas que vão atuar na ocupação das 15 comunidades do Complexo da Maré devem contar com o respaldo de mandados de busca e apreensão coletivos para permitir a localização de drogas e armas durante o cerco, previsto para ser colocado em prática no início de abril. A possível expedição pela Justiça Militar dos mandados coletivos, explicou a procuradora, deve-se à dificuldade de localizar endereços em meio ao aglomerado de casas erguidas em becos, sem numeração definida.

Nesse cenário, para evitar excessos por parte dos militares, uma comissão do MPM — integrada por Hevelize e pelos promotores Ednilson Pires, Jorge Melgaço, Max Brito e Irabeni Nunes — vai acompanhar o trabalho de ocupação da região, considerada estratégica por estar localizada entre as principais vias de acesso ao Aeroporto Internacional Tom Jobim, porta de entrada da cidade durante a Copa do Mundo.

— É importante ressaltar que um mandado coletivo não permite ao militar prender qualquer cidadão. Os nomes dos suspeitos procurados devem constar no documento. Por isso, a comissão do MPM vai acompanhar as ações militares. O objetivo é garantir os direitos individuais dos moradores e o cumprimento da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) — disse a procuradora.

Hevelize coordenou as comissões do MPM que atuaram na ocupação no Alemão, em 2010, e na Jornada Mundial da Juventude (JMJ), no ano passado. Ontem à tarde, procuradores e promotores do MPM se reuniram para elaborar um manual de atuação do órgão durante a ação dos militares na Maré, onde será instalada uma base com delegacias judiciária militar e da Polícia Civil.

O documento vai defender, por exemplo, o uso pelos militares de armas não letais, além de orientar que todas as operações sejam gravadas, a fim de evitar possíveis abusos. A iniciativa, segundo a procuradora, também visa a evitar que as tropas sejam acusadas injustamente de praticar desvios durante a ocupação. A GLO foi pedida pelo governador Sérgio Cabral à presidente Dilma Rousseff, que ainda não se manifestou.

— A orientação de filmar as ações já foi adotada durante a ocupação do Complexo do Alemão, com bons resultados — disse Hevelize.

Enquanto as Forças Armadas não dão início à ocupação, que deve acontecer entre os dias 7 e 10 de abril, equipes do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e do 22º BPM (Maré) concentram suas ações nas favelas Nova Holanda e Parque União, as únicas comunidades da região sob influência da facção responsável pelos recentes ataques à UPPs. Na noite de segunda-feira, houve um tiroteio, que, segundo os moradores, começou por volta das 20h e durou cerca de uma hora. De acordo com os PMs, bandidos que ainda permanecem na região vêm atacando durante à noite.

Devido ao clima de tensão, não houve aula numa escola municipal no turno da manhã e em oito unidades no turno da tarde, onde estudam 2.134 alunos. Já o comércio funcionou normalmente. Pela manhã, policiais do Batalhão de Ações com Cães apreenderam na Nova Holanda 30 tabletes e 26 pacotes com maconha — cada um com cerca de 200 trouxinhas —, além de um tablete de crack. Perto dali, homens do Bope localizaram um prédio que era usado para embalar drogas. Os PMs também ajudaram a retirar barreiras erguidas pelos traficantes.

Um morador, que não quis se identificar, disse que a maior parte dos bandidos fugiu na última sexta-feira. Como a maioria dos moradores, ele espera que a pacificação melhore a vida na comunidade.

Possivelmente por pressão dos criminosos, os moradores evitavam falar sobre a ocupação. Os poucos que quebraram o silêncio pediram para não ser identificados e se disseram favoráveis à implantação de UPPs na região.

— Vivo aqui há 49 anos, e os moradores estavam sendo muito oprimidos. Para quem não deve nada a ninguém, a UPP será uma boa — disse um morador.

PRESÍDIO FEDERAL PARA CHEFE DO T'RÁFICO


Beltrame pedirá à PF que Menor P. seja levado para um presídio federal. Apontado como chefe do tráfico em 11 favelas da Maré, ele foi preso na noite desta quarta-feira em um condomínio na Zona Oeste

LEONARDO BARROS E GUSTAVO GOULART, COM PAOLLA SERRA E RAFAEL SOARES, DO EXTRA 
O GLOBO
Atualizado:27/03/14 - 5h05

Apontado como chefe do tráfico de 11 favelas do Complexo da Maré, Marcelo Santos das Dores, deixa a sede da Policia Federal na Praça Quinze Fernando Quevedo / Agência O Globo


RIO — O secretário de Segurança do estado, José Mariano Beltrame, informou que vai pedir à Polícia Federal que o traficante Marcelo Santos das Dores, o Menor P., preso na noite desta quarta-feira, seja levado para um presídio federal. Ele disse que vai conversar com o superintendente da PF do Rio de Janeiro, Roberto Cordeiro, para fazer o pedido. Em nota, o secretário afirmou ainda que "a ocupação de territórios – ou mesmo o anúncio da ocupação pelas Forças de Segurança, como é o caso do Complexo da Maré – fragiliza os traficantes e permite que a Polícia efetue prisões dentro e fora desses territórios".

Por volta de 2h30m desta quinta-feira, Menor P. foi levado, num comboio da Polícia Federal, para o Instituto Médico Legal para fazer o exame de corpo de delito. Em seguida, ele foi encaminhado para o Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, Zona Oeste. De acordo com o advogado do preso, Nilson Lopes, Menor P. foi levado para o presídio de Bangu 1. O advogado também comentou a possibilidade de uma transferência para um presídio federal.

— Esse pedido é político e não podemos fazer muita coisa para mudar isso. Mostramos a nossa oposição em relação a essa ida para outro estado, já que meu cliente quer ficar perto da sua família no Rio — disse Nilson Lopes, completando que não sabe quem é o dono do apartamento em que Menor P. foi preso.

— Ele está tranquilo e só vai falar em juízo. O encontrei algumas vezes em locais que não posso revelar. Não conhecia esse apartamento e nunca estive lá. Não posso passar detalhes sobre esse assunto — contou.

Prisão em Jacarepaguá

Apontado como o chefe do tráfico em 11 favelas da Maré, Menor P. foi encontrado num apartamento na Avenida Geremário Dantas, em Jacarepaguá, na Zona Oeste. Ele estava sozinho no imóvel quando foi surpreendido por 20 policiais da Delegacia de Repressão a Entorpecentes da PF. O condomínio foi construído recentemente e tem piscina, campo de futebol, churrasqueira e academia de ginástica. No início de abril, homens do Exército vão ocupar o complexo de favelas para a instalação de uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), prevista para novembro.

Também conhecido como Astronauta, Menor P. dividiu o território dominado por sua facção em quatro áreas e nomeou, para administrá-las, bandidos de sua confiança, que fazem a segurança e cuidam da contabilidade das bocas de fumo. O traficante chama esse grupo de bandidos de “astros de sua constelação”, de acordo com um caderno apreendido por policiais da 21ª DP (Bonsucesso). Nesse caderno, o Menor P se identifica no alto da hierarquia do tráfico do Complexo da Maré.

O advogado Nilson Lopes disse, na noite desta quarta, que a imprensa está rotulando seu cliente negativamente.

— Ele é endeuzado. A imprensa quer rotular ele como ícone negativo para a sociedade. O que vai acontecer será a correção desse exagero — afirmou.


Sua quadrilha é formada por 200 homens, organizados segundo uma lógica militar. As sessões de treinamento dos “soldados” do Menor P., que foi paraquedista do Exército, são rígidas: quando algum de seus homens comete algum erro, como segurar um fuzil de forma errada, é obrigado a fazer flexões na frente da tropa. A polícia estima que a quadrilha movimenta R$ 2 milhões por semana com a venda de drogas.

Tráfico, tortura e até esquartejamentos

O traficante é investigado por crime de tráfico e tortura. Há relatos de esquartejamentos ordenados por ele dentro da favela e também da participação do bandido na execução, no ano passado, do engenheiro Gil Augusto Gomes Barbosa, de 53 anos, que entrou por engano no Complexo da Maré. Menor P era considerado foragido do sistema penitenciário. Ele foi beneficiado pelo regime semiaberto em 2007 e não voltou mais. Só na delegacia de Bonsucesso, ele é citado em cinco inquéritos diferentes.

Uma das investigações em andamento contra Menor P. envolve a morte de Wladimir Augusto da Paz, o Mimi, um ex-aliado do bandido que passou para uma facção rival. Acabou esquartejado e usado como exemplo. Segundo a polícia, Menor P. chefiava o tráfico nas localidades Baixa do Sapateiro, Conjunto Bento Ribeiro Dantas, Conjunto Esperança, Conjunto Marcílio Dias, Conjunto Pinheiro, Nova Holanda, Nova Maré, Parque Maré, Parque Roquete Pinto, Parque Rubens Vaz, Parque União, Praia de Ramos, Salsa e Merengue, Timbau, Vila do João e Vila do Pinheiro. Somente as favelas Nova Holanda e Parque União são controladas por uma facção rival, enquanto a Praia de Ramos é dominada por milicianos.

De acordo com informações da polícia, numa operação do 22º BPM apreenderam numa das favelas sob seu controle o medicamento Tocilizumab, uma substância aprovada somente no Japão para o tratamento da Síndrome de Castleman — doença rara caracterizada pelo surgimento de nódulos linfáticos — e que é uma aposta da área médica para o tratamento e controle da artrite reumatóide. Os policiais foram até o local após informações do Disque-Denúncia, que oferecia R$ 2 mil por pistas dele.

Além das caixas de Tocilizumab — que seriam entregues no Centro de Radioterapia e Medicina Nuclear, no Centro de Juiz de Fora, em Minas Gerais —, havia dezenas de embalagens do tranquilizante Bromazepan, do antiinflamatório Reparil e deBramin — usado para alívio ou eliminação de náuseas e vômitos, inclusive da gravidez, em pré e pós-operatórios.

Menor P. também é acusado de ter agredido o jogador Bernardo, do Vasco, por um envolvimento do meia com Daiane Rodrigues, que seria "namorada número 1" do criminoso. A agressão aconteceu no ano passado.

MORADORA COMO PROTAGONISTA

O GLOBO, Corpo a corpo - 27/032014

Ludmilla de Lima


Pacificação precisa ter morador como protagonista, diz diretora de ONG na Maré

Fundadora e diretora da ONG Redes de Desenvolvimento da Maré, Eliana Sousa Silva defende que a ocupação da comunidade conte com a participação dos moradores. Ela diz que há dois anos, desde que a instalação de uma UPP na Maré passou a ser cogitada, a população local e as organizações presentes no conjunto de favelas vinham discutindo esse processo, dentro da campanha “Somos da Maré e temos direitos”, e mantendo um diálogo com a Secretaria estadual de Segurança. Ex-moradora da comunidade por 28 anos, Eliana, de 51 anos, é doutora em Ciências Sociais e autora do livro “Testemunhos da Maré” (Aeroplano)

Soldados do Exército procuram armas na horta num Ciep, no Complexo da MaréMARCIA FOLETTO / AGÊNCIA O GLOBO

Como a Redes observa hoje a chegada de tropas federais e policiais à Maré?

— Precisamos pautar o direito à segurança pública como demanda que exige a participação dos moradores. Aqui na Maré temos trabalhado sobre a perspectiva de abordagem que o policial faz e de que os grupos criminosos armados não podem dar a tônica do funcionamento da comunidade. São questões a longo prazo, e os moradores precisam ser protagonistas desse processo.


Como deve ser essa participação dos moradores?

— Acredito que o morador primeiro tem que ser reconhecido como cidadão que tem condições de ver esse processo de uma forma menos passiva, menos como espectador. A ideia que, muitas vezes, é passada é de que quando chega o programa da UPP o morador apenas assiste, como se não tivesse voz. O trabalho agora deve ser o de mobilizar para discutir como deve ser feito esse processo. É preciso ainda se libertar dessa ideia de tutela. Se antes os moradores viviam sob a tutela de grupos armados, não pode o estado com a policia agir agora como se fosse o poder que vai tutelar os moradores. A sua paticipação tem que envolver o entendimento de que os moradores, com a chegada da polícia, estão recebendo um direito que não tinham antes.

Como a Redes atua para garantir essa participação?

Participamos dos conselhos estadual e nacional de Segurança Pública e já fizemos uma trabalho, que incluiu um panfleto, sobre abordagem policial. Como o policial deve abordar os moradores na rua e na sua casa. E, há mais de um ano, temos feito reuniões com representantes da PM, do Bope, do Centro de Operações Especiais (COE). Quando foi feita a campanha da abordagem policial, procuramos o Beltrame. Sempre houve tentativa de estabelecer um diálogo. Não fazemos um trabalho de contestar por contestar. Buscamos atuar nesse campo para diminuir a violação em cima dos moradores de favela. Não adianta só a entrada da PM. O direito à segurança prevê também o acesso à Justiça.

Depois de anunciada a ocupação, a Redes e os moradores já sentaram para discutir a questão?

A gente está internamente na Maré fazendo reuniões com as organizações locais e associações de moradores. Também fazemos parte de um coletivo de pessoas que trabalham e estudam segurança pública. Estamos tentando nos mobilizar para entender esse processo. A gente já vem há algum tempo tentando diálogo com a Secretaria de Segurança para tentar contribuir. Pela localização estratégica e pelo conjunto de experiências já existentes na Maré, há espaço para um diálogo mais qualificado. Ontem (anteontem) fizemos uma reunião para entender por que militarizaram a ocupação, tornaram a coisa tão bélica, acirrando o que já era bélico pelos grupos criminosos.

Qual o maior problema dessa militarização?

Estão usando o artifício do mandado coletivo para entrar em qualquer casa. Isso não é juridicamente permitido. E pensar que estamos fazendo 50 anos do golpe, que o país avançou e hoje é uma democracia. Um mandado coletivo fere princípios do regime democrático. Não é o caso de um estado de exceção. Esse processo precisa ganhar outra coloração. Um frecsor que tem que passar pelo respeito e a não violação de um dereito que é inviolável, que é a casa das pessoas. Isso nos preocupa.

Que tipo de problema os moradores da Maré temem?

A gente não pode repetir os equívocos que aconteceram em outras áreas, como no Alemão. No Alemão, houve uma antecipação da ocupação, seja por militares quanto pela instalação da UPP. O que ouvimos é que houve violação no momento em que a polícia entrou, usando o artifício da violência. Na Maré, há um reconhecimento da demanda que existe no campo da segurança pública Por isso, o estado não pode chegar violando direitos.

Existe já esse diálogo com a Secretaria de Segurança?

Esse dialogo já estava acontecendo e recebi e-mail para uma reunião amanhã (hoje) no Coe, que fica perto da Maré. Vai ser com associações de moradores e algumas organizações, às 9h. Existe abertura de espaço para o dialogo, mas o que vejo que falta é incorporar a demanda desses grupos.

Quais são as demandas?

Há a demanda muito forte de melhorar a educação publica local e de melhorar a questão do acessos. A Maré fica entre a Linha Amarela, a Linha Vermelha e a Avenida Brasil, mas tem problema sério de mobilidade. Tem também a questão ambiental: por conta dessas três vias, é o pior ar que se respira no Rio. Tem muitos moradores com problemas de saúde. E há as diferentes violências envolvendo grupos armados criminosos. A falta do aparato da Justiça também é uma demanda. A Polícia Civil e os órgãos de Justiça têm que estar presentes. A Maré tem porte de cidade, e a ação do poder público tem que ser muito mais ampla e estrutural do que se vê hoje.

Como está o clima dentro da comunidade?

Há uma certa apreensão sobre o que vai acontecer e há uma curiosidade ao pensar a vida fora daquele escopo, de uma paisagem com muita arma e violência.

Quantos projetos são empreendidos hoje pela Redes?

A Redes tem 16 anos e hoje 17 iniciativas, dentro de cinco eixos: educação, segurança publica, desenvolvimento territorial, arte e cultura e ainda comunicação. De quatro a cinco mil pessoas hoje participam dos projetos.

BOPE TER]A TRÊS BASES DE APOIO NA MARÉ


Bope terá três bases de apoio durante ocupação da Maré. Cerca de mil homens da PM vão entrar nas 16 favelas que formam o complexo de favelas na madrugada de domingo. Nesta sexta-feira, o clima é tenso na região

ANA CLÁUDIA COSTA 
O GLOBO
Atualizado:28/03/14 - 14h50

Policiais militares durante patrulhamento na Maré. Na foto, umas das ruas do complexo de favelas praticamente vazia Marcos Tristão / Agência O Globo


RIO - O Batalhão de Operações Especiais (Bope) terá três bases de apoio durante a ocupação do Complexo da Maré, na Zona Norte do Rio. Considerado um ponto estratégico no complexo de favelas por ser alta e ter observação privilegiada das linhas Vermelha e Amarela, a Ilha dos Macacos será uma das bases montadas pelo Comando de Operações Especiais (COE) da PM durante a ocupação. A sede do COE, que funciona onde era o antigo Batalhão de Infantaria do Exército, na entrada da Ilha do Governador também servirá de base para a tropa. Um outro ponto de apoio, mas próximo à Vila do João será montado pela tropas da PM.

Cerca de mil homens da Polícia Militar, incluindo o Bope, Batalhão de Choque (BPChoqu) e Batalhão de Ações com Cães (BAC) vão ocupar as 16 favelas que fazem parte do complexo a partir da madrugada deste domingo. O uso dos blindados da Marinha e da Aeronáutica está sendo negociado para a ocupação. A ação na Maré será realizada nos mesmos moldes do Complexo do Alemão. O efetivo da Polícia Militar será substituído, aos poucos, pelas tropas federais, que ficarão por tempo indeterminado na Maré.

Nesta sexta-feira, o clima é tenso no Complexo da Maré. Nos acessos às favelas Nova Holanda e Parque União, na Avenida Brasil, equipes do 22º BPM (Maré) fazem patrulhamento e abordam carros. Policiais do Bope fazem operações no interior dessas comunidades. Moradores informaram que as escolas da região pediram que as crianças que não tiveram aulas evitem ficar circulando pelas ruas.

Nesta quinta-feira durante reunião com representantes da Maré, subcomandante do Comando de Operações Especiais da Polícia Militar, tenente-coronel Rodrigo Sanglard, garantiu que não haverá excessos e pediu que qualquer problema seja denunciado.

O oficial disse ainda aos moradores que, diferentemente do foi divulgado pelo Ministério Público Militar, não haverá um mandado de busca e apreensão coletiva. Segundo o tenente-coronel, as casas só serão revistadas se houve um mandado judicial específico, se o morador permitir ou se estiver ocorrendo um crime no local.

Desde o anúncio de que o Rio receberia o apoio de tropas federais no combate à violência em regiões pacificadas, na semana passada, a Polícia Militar reforçou o policiamento com cerca de 120 homens do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) em favelas da Maré e iniciou operações simultâneas.

O pedido de ajuda do governo federal veio após os ataques às bases das UPPs de Manguinhos e Camarista Méier. Na ocasião, dois policiais ficaram feridos, incluindo o comandante da UPP da região, o capitão Gabriel de Toledo, baleado na virilha. Bandidos atearam fogo em cinco bases da UPP de Manguinhos. Dois carros da PM também foram destruídos. Desde fevereiro, o tráfico vem orquestrando ataques a regiões pacificadas. Este ano, somente no Complexo do Alemão, quatro PMs de UPPs já foram mortos em ataques do tráfico. Além disso, já foram registrados cerca de 30 tiroteios na Favela da Rocinha, na Zona Sul.


quinta-feira, 27 de março de 2014

EXÉRCITO E BOPE JUNTOS


ZERO HORA 27 de março de 2014 | N° 17745


HUMBERTO TREZZI | RIO

OPERAÇÃO NO RIO. Exército e Bope juntos no Complexo da Maré

Pela primeira vez em três anos, as duas forças voltam a realizar patrulhamento em favelas conflagradas



A anunciada e celebrada ajuda das Forças Armadas no desmantelamento de redutos violentos do tráfico no Rio de Janeiro não ficou só na retórica. Militares do Exército e da PM fluminense realizaram ontem, antes da data prevista, que era 7 de abril, uma operação conjunta na favela Nova Holanda, no Complexo da Maré, próximo ao Aeroporto Internacional Tom Jobim.

Éa primeira ação colaborativa entre as forças federais e estaduais no Rio desde 2011. A região da Maré deve ser ocupada totalmente pelos militares já na semana que vem, em decorrência de pedido do governo estadual.

A ponta de lança do Exército na operação, ainda antes da ocupação, é o uso de sapadores para localizar armas. Quinze homens do 1º Batalhão de Engenharia de Combate e Escola do Exército, cuja sede fica no bairro de Santa Cruz (RJ), iniciaram, na manhã de ontem, uma varredura em busca de paióis (esconderijos) de armas dos traficantes da Maré. Contaram para isso com rastreamento prévio e escolta do Bope, o temido Batalhão de Operações Especiais da PM fluminense, celebrizado nas série de filmes Tropa de Elite.

Detectores de metais foram usados para encontrar armas

Os “caveiras” do Bope, vestidos de preto e portando fuzis com mira telescópica, se empoleiraram nos prédios de escolas da favela Nova Holanda para garantir a passagem do pessoal da Engenharia do Exército. Por não ter ainda ocorrido a ocupação pelo Exército, os militares federais não portavam armamento.

Levavam nas mãos detectores de metais, usados para rastrear minas explosivas, mas que, ontem, foram empregados para tentar localizar objetos metálicos em território transformados em esconderijo por traficantes. Os aparelhos são capazes de verificar a presença de armas e alguns tipos de explosivos enterrados no solo a uma profundidade de até 1,5 metro.

– É possível localizar até uma agulha enterrada num buraco de 30 cm – garante o capitão Rafael Medeiros, comandante do pelotão.

Em um entrosamento raro, policiais e militares do Exército andavam em duplas. As buscas se concentraram num terreno usado como horta e situado entre dois CIEPs (Centros Integrados de Educação Pública), na divisa das favelas Nova Holanda e Parque União. Próximo à Linha Amarela, freeway que liga as zonas leste e oeste do Rio, esses CIEPs também formam a divisa de territórios entre as duas maiores facções criminosas que atuam nas 11 comunidades do Complexo da Maré.

De um lado dominam os bandidos do Terceiro Comando Puro (TCP). De outro, os do Comando Vermelho. Os PMs e militares do Exército tiveram de fazer seu trabalho em meio a vidraças quebradas, slogans agressivos pintados nas paredes (palavrões hostilizando as Unidades de Polícia Pacificadora) e estouros incessantes de fogos de artifício, disparados por olheiros dos traficantes, mas que faziam tremer cada soldado pela semelhança com disparos de fuzil.

Ontem à noite, o chefe do tráfico em 11 favelas da Maré, Marcelo Santos das Dores, o Menor P, foi preso por agentes da Polícia Federal em um apartamento em Jacarepaguá. O traficante dividiu o território dominado por sua facção em áreas e escolheu homens de sua confiança para administrá-las, conforme reportagem do jornal O Globo.


A OCUPAÇÃO - Complexo da Maré, que já está sob intenso patrulhamento do Bope e do 22º Batalhão da PM fluminense, - Ganhará no início de abril (possivelmente dia 7) reforço de 4 mil PMs, integrantes das Forças Armadas e da Polícia Federal. - Nas 11 favelas da região vivem 130 mil pessoas. - A estimativa das autoridades é de que pelo menos 500 bandidos fortemente armados atuem no Complexo da Maré. Ação antecipada

quarta-feira, 26 de março de 2014

EXÉRCITO FAZ VARREDURA EM BUSCA DE ARMAS E EXPLOSIVOS

ZERO HORA ONLINE 26/03/2014 | 10h10

Exército faz varredura em busca de armas e explosivos no Complexo da Maré, no Rio de Janeiro. Equipamentos podem detectar objetos metálicos em até 30 centímetros sob o solo



Foto: Fernando Gomes / Agencia RBS


Humberto Trezzi e Fernando Gomes, enviados ao Rio de Janeiro



Quinze homens do 1º Batalhão de Engenharia de Combate (Escola) do Exército do Rio de Janeiro, cuja sede fica no bairro de Santa Cruz, iniciaram, na manhã desta quarta-feira, uma operação de varredura da favela Nova Holanda, no Complexo da Maré. A região deve ser ocupada pelos militares já na semana que vem após pedido do governo estadual.

A equipe fará a detecção de objetos metálicos nas residências suspeitas de pertencer a traficantes daquela localidade. O grupo está munido de detectores de metal capazes de verificar a presença de armas e explosivos enterrados no solo a uma profundidade de até 30 centímetros.

— É possível localizar até uma agulha enterrada a esta distância — garante o capitão Rafael Machado, comandante do pelotão.

Essa é a primeira aparição das Forças Armadas no conflituado cenário da Maré, complexo de 11 favelas situado nas proximidades do Aeroporto Internacional Tom Jobim (antigo Galeão) e reduto do Comando Vermelho, maior facção criminal do Rio de Janeiro.

EXÉRCITO COMEÇA A DAR APOIO ÀS AÇÕES DA PM


Exército começa a dar apoio às ações da Polícia Militar na Maré. Equipes farão buscas a paióis de armas de traficantes nas favelas Parque União e Nova Holanda, com uso de detectores de metal. Data da ocupação definitiva da região ainda não foi divulgada

SÉRGIO RAMALHO
VERA ARAÚJO
O GLOBO
Atualizado:26/03/14 - 11h33


Equipes do Exército chegam ao Batalhão da Maré para dar apoio à PM Márcia Foletto / Agência O Globo


RIO - Uma equipe do 1º Batalhão de Engenharia de Combate do Exército fará um trabalho de busca aos paióis de armas de traficantes com uso de detectores de metal MD8, no Complexo da Maré, na Zona Norte da cidade, nesta quarta-feira. O equipamento é capaz de encontrar uma agulha enterrada a até 30 centímetros de profundidade. De acordo com o capitão do Exército Rafael Medeiros, informações repassadas pelo Batalhão de Operações Especiais (Bope) dão conta de que os traficantes teriam enterrado armas em alguns pontos das favelas Parque União e Nova Holanda, dominadas pela facção responsável pelos ataques recentes às UPPs.

De acordo com o capitão, são 15 homens equipados com dez detectores de metal. Alguns dos soldados usarão roupas antiexplosão, pois o Exército não descarta a possibilidade de haver armadilhas com explosivos instalados por traficantes próximo aos pontos onde teriam sido enterrados os armamentos. Nos próximos dias, os soldados vão vasculhar uma área de 141 mil metros quadrados, onde se estima que haja cerca de 3,5 mil residências. Antes da publicação da Garantia de Lei e de Ordem (GLO) pela Presidência da República, os soldados não poderão agir como policiais e, por isso, atuarão em conjunto com agentes do Bope.


O caminhão com os homens do Exército chegou ao 22º BPM (Maré) nesta manhã. A presença dos soldados na comunidade faz parte de ações de inteligência para planejar a ocupação das favelas. Mais cedo, policiais do Batalhão de Ações com Cães (BAC) percorreram ruas do Parque União e da Nova Holanda com mandados de busca e apreensão e de prisão contra integrantes da quadrilha que comanda o tráfico de drogas na região. Muitas crianças que iam para a escola retornaram para suas casas porque algumas unidades não estariam funcionando por falta de professores.

O comando das operações do Exército no Complexo da Maré tem como objetivo, esta semana, fazer um levantamento detalhado das 16 comunidades que compõem a área. A previsão é de que um avião também seja usado para fazer o trabalho de georreferenciamento a fim de obter, com precisão, as coordenadas (pertencentes ao sistema no qual se pretende georreferenciar) de pontos da imagem ou do mapa, conhecidos como pontos de controle. A partir destes dados, será possível distribuir no espaço patrulhado o número de bases a serem montadas pelo Exército. Nos complexos do Alemão e da Penha, por exemplo, foram criados 10 setores, cinco para cada área.

O Exército possui na região, às margens da Avenida Brasil, o Centro de Preparação de Oficiais da Reserva (CPOR), que servirá de quartel general da tropa. Os militares do Bope já têm uma base no complexo de favelas da Maré, onde vão planejar suas operações. Trata-se do Centro de Operações Especiais (COE), em conjunto com o Grupamento Aeromóvel (GAM), que também atuará no complexo patrulhando o Canal do Cunha e parte da Baía de Guanabara às da Maré.

O Comando Militar do Leste (CML) fez o planejamento da ação, que foi batizada de Operação São Francisco, nesta terça-feira. Em nota, o Exército não quis informar dados sobre o tipo de tropa, veículos, armamentos, efetivo, área de atuação e período da operação. O texto diz ainda que: “O planejamento também visa a minimizar o impacto das ações para a população local”.

Anúncio da ocupação na Maré

A ocupação por homens do Exército, no Complexo da Maré, foi anunciada na última segunda-feira pelo secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame. A Polícia Federal vai ajudar com o serviço de inteligência e a Polícia Rodoviária Federal vai auxiliar no cerco aos acessos, nos mesmos moldes da ocupação do Complexo do Alemão, em novembro de 2010. Segundo Beltrame, a ocupação servirá de preparação para que o processo de pacificação seja implantado na região. O secretário disse que 1.500 homens devem atuar na Unidade de Polícia Pacificadora da Maré.

Na ocasião, durante reunião no Centro Integrado de Comando e Controle (CICC), na Cidade Nova, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que não há prazo definido para a permanência dos homens da Polícia Rodoviária Federal, da Força Nacional e das Forças Armadas na cidade.

Desde a última sexta-feira, seis favelas dominadas pela facção que teria orquestrado os recentes ataques estão ocupadas pelas forças de segurança. A ocupação será mantida por tempo indeterminado. Policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope) estão no Parque União e a Nova Holanda, no Complexo do Maré. Outros batalhões da PM tomaram os morros do Chapadão, em Costa Barros; do Juramento e Juramentinho, em Vicente de Carvalho; e a favela Para-Pedro, em Colégio.


DE BECO EM BECO NA MARÉ


ZERO HORA 26 de março de 2014 | N° 17744


HUMBERTO TREZZI | ENVIADO ESPECIAL/RIO


VIOLÊNCIA NO RIO. Zero Hora acompanhou o patrulhamento no complexo de favelas dominado por facções criminosas


A garotada descalça e sorridente acompanha o vaivém dos PMs pelos becos da Nova Holanda, no Rio. Os guris fazem troça e imitam o andar marcial de alguns policiais, correndo ao primeiro olhar carrancudo.

Para eles, tudo é diversão. Já para parte dos habitantes daquela comunidade, a maior das 11 favelas do Complexo da Maré, a onipresença da PM é uma novidade que desperta temor. Lá, o tráfico ainda é a lei, e os fardados, para muitos, são vistos como tropa de ocupação.

Essa estranheza tem tudo para aumentar nos próximos dias, quando o Exército tomar todo esse conjunto de vilas na Zona Norte carioca, onde moram 130 mil pessoas. Foram escolhidos como alvo por serem um dos maiores redutos do Comando Vermelho, a maior facção criminal fluminense, responsável por ataques sistemáticos a policiais desde o início do ano.

Foram sete atentados contra Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), bases comunitárias da PM que representam a maior novidade na segurança pública brasileira nas últimas décadas. Quatro policiais morreram nesses ataques, que teriam sido ordenados de dentro dos presídios, numa represália do CV ao desmantelamento de suas bocas de fumo. Compreensível. Das 37 UPPs, 32 ficam em áreas dominadas pelo Comando Vermelho.

Raíza Oliveira Cavalhares, uma dona de casa de 25 anos que mora na Nova Holanda, é uma das que enxergam os PMs como inimigos. Ela teve o barraco ocupado e revistado por policiais do 22º BPM na nublada e calorenta tarde de ontem. São eles que “aplainam o terreno” para a anunciada ocupação do Exército – traduzindo, vão de beco em beco atrás de traficantes e anunciando a chegada de reforços. É a tática do espantalho, que parece estar funcionando. Zero Hora acompanhou na tarde de ontem a incursão de um pelotão pelas vielas locais, e os bandidos, chamados de “patrões” na região, não apareceram.

A presença dos PMs incomoda. Muita gente fecha as portas. Outros apenas olham feio. Alguns frequentadores de bar olham, entediados, o avançar cuidadoso e desconfiado dos policiais – convictos de que em cada dobra de esquina pode estar uma armadilha, um atirador. Parece exagero, mas podem ter razão. No último sábado, esses mesmos policiais apreenderam num barraco da Nova Holanda – mediante denúncia anônima de um morador – um fuzil Mauser com silenciador e mira telescópica.

Na lenta progressão dos policiais não faltam bate-bocas. Ao fazer a revista, os PMs teriam quebrado uma TV de Raíza. Ela e as vizinhas saíram chorando e, ao verem jornalistas, se queixaram de abuso policial. Os policiais se defendem, dizendo que a casa foi apenas revistada, porque Raíza é suspeita de abrigar um foragido. Nada encontraram. ZH tentou entrar na casa, mas ela estava cercada pelos PMs.

– É mentira, sou limpa – avisa.

O tenente-coronel Silva Junior, responsável pelo patrulhamento na Maré, promete investigar o caso. Um tipo de confusão que tem tudo para se repetir nas próximas semanas.



OCUPAÇÃO COMEÇA EM 13 DIAS

- Mais de 4 mil militares das Forças Armadas (Exército e Marinha) serão a ponta-de-lança da maior ofensiva já realizada no país contra o crime organizado.

- Ela deve acontecer dia 7 de abril, com a ocupação do Complexo da Maré, conjunto de 11 favelas situadas à beira-mar, na zona norte do Rio, onde moram cerca de 130 mil pessoas.

- A região é estratégica por estar situada entre a Linha Vermelha, a Avenida Brasil e a Via Amarela.

- O complexo é uma fortaleza disputada pelo Comando Vermelho (CV), seus rivais do Terceiro Comando Puro (TCP) e uma milícia formada por ex-policiais e policiais aposentados. O CV domina as principais favelas da Maré, como a Nova Holanda.



Marca de tiros em blindado da PM, conhecido como Caveirão, revela intensidade de confrontos em comunidade ainda não pacificada

terça-feira, 25 de março de 2014

UM MILITAR PARA CADA 55 MORADORES

O DIA 25/03/2014 00:16:51


Complexo da Maré terá um militar para cada 55 moradores. Índice é sete vezes maior que a média do estado, de 369 habitantes por policial


CHRISTINA NASCIMENTO , FELIPE FREIRE , HERCULANO BARRETO FILHO E VANIA CUNHA



Rio - O pedido de socorro do estado ao governo federal para enfrentar os criminosos responsáveis pelos ataques em série a bases de UPPs acabou resolvendo outro entrave na segurança pública: a pacificação da Maré, que se arrastava há três anos. O governador Sérgio Cabral confirmou ontem que o Exército vai ocupar o conjunto de favelas no caminho do Aeroporto Internacional Tom Jobim (Galeão).

O complexo de 130 mil habitantes terá, a partir do dia 5, um militar para proteger cada grupo de 55 moradores. O número corresponde a 2.400 agentes, sendo dois mil do Exército e 400 do Batalhão de Campanha da Polícia Militar. No estado, a proporção é de um PM para 369 habitantes.

A decisão de ocupar a Maré foi tomada após reunião com o chefe do Estado- Maior das Forças Armadas, general José Carlos de Nardi, e o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo.
Segundo o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, a medida não tem relação com os recentes ataques às UPPs.



Sérgio Cabral e o general José Carlos de Nardi se reuniram ontem com Pezão, José Eduardo Cardozo e Beltrame, para decidir a ocupaçãoFoto: Severino Silva / Agência O Dia

Um dos obstáculos para a pacificação, segundo fontes da PM, era a falta de efetivo. Para evitar novos ataques, as áreas de UPPs foram reforçadas pela própria PM, mas a solução definitiva não foi anunciada.

“A resposta é o avanço do processo de pacificação. Não há relação com os ataques. Isso já estava programado. E se eles (traficantes) resistirem, vamos continuar avançando. Não há ligação com a Copa, pois a Copa vai embora e a Maré continua”, disse Beltrame. No segundo semestre, a Maré também ganhará a sua UPP, como anunciou o ministro Cardozo.

A ocupação será realizada em duas fases. A primeira, neste domingo, terá agentes dos batalhões de Operações Especiais (Bope) e de Choque, do 22º BPM (Maré) e da Polícia Rodoviária Federal. A ação contará com blindados da Marinha, o que depende do Ministério da Defesa. Inicialmente, haverá uma varredura para preparar o terreno para o Exército. Nesta fase, a PM vai fazer incursões e revistas para prender criminosos e apreender armas e drogas. Também serão cumpridos os mandados de prisão expedidos para criminosos da região. A PM realizará ainda operações em outros pontos do estado, para evitar a fuga de bandidos.



No complexo de 15 favelas, com 130 mil habitantes, ação será intensa com presença de um agente para cada 55 moradores. No estado, relação é de um PM para cada 369 pessoasFoto: Carlos Eduardo Cardoso / Agência O Dia

Pelo planejamento decidido em reunião ontem no Comando Militar do Leste, as tropas do Exército devem entrar no complexo uma semana depois, em 5 ou 6 de abril. Os militares serão divididos em quatro batalhões, mas a localização das bases não foi definida. Eles virão de batalhões de Infantaria e Paraquedista. O comando da ação não definiu se a tropa virá de fora do estado.

A PM vai formar um Batalhão de Campanha para auxiliar a tropa verde-oliva no reconhecimento de área e com informações da inteligência. O efetivo da PM será remanejado de diversas unidades para atuar na Maré. No entanto, como o Exército atuará com a Garantia da Lei e da Ordem (GLO), toda e qualquer ação de outras forças terá que ser autorizada ou acompanhada pela força militar.

GLO: opção quando todos os recursos se esgotam

Para que as Forças Armadas ocupem a Maré é necessário, primeiramente, que a presidenta Dilma Rousseff autorize o ato numa publicação no Diário Oficial da União. De acordo com o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, não se trata de um decreto, mas de uma ‘exposição de motivos’.

O manual do emprego das Forças Armadas na Garantia da Lei e da Ordem (GLO) foi elaborado a partir de experiências adquiridas a Rio+20 e a ocupação do Complexo do Alemão. O documento determina que o uso de tropas federais ocorre em caráter excepcional, quando, por exemplo, foram esgotadas as estruturas de segurança pública estadual para proteger a população e o patrimônio.



A série recente de ataques a UPPs em vários pontos do Rio levou o governador a pedir ajuda federalFoto: Osvaldo Praddo / Agência O Dia

A atuação da tropa tem que ser por tempo e espaço definidos, o que será estabelecido na publicação de Dilma. Nada, no entanto, impede que, vencido o prazo, a permanência seja estendida para nova data. No ano passado, o manual foi alvo de polêmica, o que resultou numa edição revisada no mês passado. A mudança ocorreu porque a primeira redação indicava que movimentos sociais poderiam ser considerados "forças oponentes".

Será a primeira vez que vai ocorrer o emprego das Forças Armadas após atualização no texto. Desta vez, a redação descreve Agentes de Perturbação da Ordem Pública, os APOPs, como pessoas ou grupos cuja “atuação momentaneamente comprometa a preservação da ordem pública ou ameace a incolumidade das pessoas e do patrimônio.”



Moradores têm medo de ficar no meio do fogo cruzado


Há apenas um mês, um morador do Parque União, no Complexo da Maré, ouviu um estouro por volta das 5h da manhã. Mais tarde, a mulher dele encontrou uma cápsula usada numa operação policial de combate ao tráfico. É exatamente esse tipo de situação que temem os moradores da região, às vésperas da chegada das tropas militares.

Diretor do Observatório de Favelas, Jailson de Souza e Silva tem uma preocupação, compartilhada por boa parte dos moradores que se acostumou a conviver com tiroteios entre policiais e traficantes: o medo de ficar no meio do fogo cruzado.

“A gente não sabe o que pode acontecer quando se usa força militar em território urbano. Os soldados são preparados para a guerra, para enfrentar o inimigo e matar. A vida dos moradores precisa ser respeitada e não pode ser moeda de troca para combater a criminalidade”, comenta.


Jailson alerta para uma possível tentativa de fazer com que os moradores fiquem subordinados aos militares. “Esse controle de território deve ser feito para garantir a segurança. Não é para controlar os moradores”, adverte.


Foto: Arte O Dia

A comunicadora comunitária Renata Guilherme teme que as Forças Armadas não saibam lidar com os moradores. “Os militares foram treinados para a guerra. Será que vão saber lidar com a população?”, questiona.

X., um jovem de 16 anos que mora na Vila dos Pinheiros, teme que o Exército repita práticas que ele relata ter presenciado em operações policiais desde a infância.


“Quando começam a dar tiros, não dá pra ficar em pé. Todo mundo tem que se abaixar. A polícia, quando entra aqui, é para oprimir. Às vezes, não é nem um tiro. É um tapa na cara, um pé na porta, um xingamento... O medo é que isso volte a acontecer agora, com os militares na comunidade”, afirma X.


Entretanto, ele vê um lado positivo com a entrada do Exército: a possibilidade de circular por todas as favelas da região. “Aqui, tem traficantes de diferentes facções. Quem é da Baixa do Sapateiro não anda pela Nova Holanda. O Exército vai facilitar a circulação dos moradores. Mas isso não basta. A minha mãe tem 60 anos e precisa caminhar por 40 minutos para pegar um ônibus. A gente quer transporte público, calçadas asfaltadas e saneamento básico”, reivindica.

Projeto inspirado na ocupação do Alemão

A operação definida ontem foi traçada nos mesmos moldes da ocupação desencadeada em 2010 no Complexo do Alemão. Naquela ocasião, depois que a PM saiu, o Exército ocupou a área por dois anos, até a instalação de Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs). Hoje, a PM reunirá os chefes de quatro Comandos de Policiamento de Áreas (CPAs), para fechar os detalhes da ação.
Uma das principais diferenças é que na Maré não serão expedidos mandados de busca e apreensão coletivos. A experiência foi criticada no Alemão.

Especialistas ressaltam que a mudança de estratégia do governo do Rio, que foi pediu um auxílio e trouxe outro, não ficou clara. “Se não revelarem informações da iminência de uma guerra na Maré ou a necessidade da ocupação em momento de crise em outras áreas, pode dar a impressão de que é um instrumento eleitoral. A Rocinha e o Alemão estão próximos de perder o controle. E o reforço nestas áreas contribuiria para consolidar o projeto”, analisou o ex-capitão do Bope, Paulo Storani.

O conjunto de 15 favelas é dominado por duas facções criminosas e por milicianos, sendo a maior parte controlada pelo Terceiro Comando Puro (TCP), que não é a mesma quadrilha que predomina nas áreas em que as UPPs foram atacadas recentemente. O ministro informou que não há prazo para as tropas federais saírem e não descartou a ajuda a outras comunidades. “Do ponto de vista estratégico e tático, é fundamental. Temos um plano de segurança para a Copa e o Brasil está preparado”, explicou Cardozo.

Já para o governador, a estratégia pode estar ligada “direta ou indiretamente” aos ataques e a retomada da Maré beneficiará a competição de junho. “É próximo ao Aeroporto do Galeão e por lá passam as linhas Vermelha e Amarela e a Av. Brasil. A população não quer mais criminosos circulando como se a comunidade fosse território deles.”

Desde a semana passada, as polícias ocupam a Nova Holanda e o Parque União, na Maré; os morros do Chapadão, em Costa Barros, e Juramento, em Vicente de Carvalho.