O Rio de Janeiro é o espelho do Brasil. O que ocorre no Rio de Janeiro fatalmente se transmitirá em cadeia para os outros Estados da Federação. As questões de justiça criminal e ordem pública não fogem desta regra. Portanto, é estratégico manter a atenção, estudar o cenário, analisar as experiências e observar as políticas lá realizadas, ajudando no alcance dos objetivos. A solução desta guerra envolve leis duras e um Sistema de Justiça Criminal integrado, ágil, coativo e comprometido em garantir o direito da população à segurança pública.

quarta-feira, 9 de abril de 2014

MARCA DA SERENIDADE



Programa de pacificação deve ter a marca da serenidade. Forças Armadas e polícias se deparam com clima tenso na Maré, um desafio na ocupação local. Projeto de UPPs não pode ser contaminado pela política

EDITORIAL
O GLOBO
Publicado:9/04/14 - 0h00


A ocupação do Complexo da Maré por um combinado de tropas das Forças Armadas e agentes da polícia, no fim de semana, foi previsivelmente tranquila, do ponto de vista da operação em si. Mas, como O GLOBO registrou ontem, o “dia seguinte” — o risco de, como tem acontecido em comunidades já pacificadas, a simples presença dissuasória do Estado não ser suficiente para conter a reação do crime organizado — dá sinais de que pode estar chegando mais cedo. No primeiro dia útil em seguida à invasão, anteontem, o clima na Maré era tenso. O jornal registrou: “Nas favelas, moradores ainda evitavam se aproximar tanto de militares quantos dos jornalistas (...)” Homens estranhos às forças legais, ainda que desarmados, circulavam com radiotransmissores, supostamente monitorando a movimentação das tropas.

É uma realidade distinta da que se registrou após a chegada das tropas ao Complexo do Alemão, paradigma para a operação do fim de semana na Maré. O programa de retomada da comunidade encravada às margens da Avenida Brasil está diante de um desafio até certo ponto inédito em todo o projeto de pacificação/UPPs. Se as ocupações anteriores foram, grosso modo, pouco mais que passeios, dos quais resultaram o afastamento imediato e, ao menos num primeiro momento, total das quadrilhas lá incrustadas, agora o Estado lida com um panorama em que, se não há explícita hostilidade, existem no mínimo sinais de que a comunidade está ressabiada com a nova ordem.

Isso não é bom para o reconhecimento da força de pacificação como agente deflagrador das mudanças que, por certo, esperam os moradores, submetidos a longo período de subjugação pela violência do crime organizado. Essa nova realidade implica adotar protocolos até aqui pouco ou nada empregados nas experiências anteriores. Forças Armadas e polícia devem atuar com serenidade e habilidade não só para reduzir o clima de tensão e para enfrentar as escaramuças — até agora, felizmente, não muito graves — registradas nas favelas do complexo nos últimos dias. Reações impensadas podem ressuscitar o fantasma da rotina da força imposta pela intimidação, marca do domínio dos bandidos que a comunidade, por certo, deseja ver enterrada.

A pacificação não se resume às operações policial-militares, sequer à instalação de UPPs. Trata-se de um processo longo, mas que carece, desde o início, de apoio e participação dos atores locais (agentes de organizações civis, diretores de escolas e unidades de saúde, população etc.). Assegurar confiança e parceria de quem se pretende beneficiar é cuidado inescapável.

Junte-se a isso a precaução com um planejamento seguro de consolidação do terreno conquistado e de expansão do programa de UPPs, pressuposto para toda a agenda de pacificação. Nisso se inscreve a imperiosidade de desidratar na fonte qualquer tentativa de contaminá-la com ações políticas e/ou eleitorais, o que seria fatal para a credibilidade do projeto.

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